O SENHOR TE CHAMA


"Gostaria de dizer àqueles e àquelas que se sentem longe de Deus e da Igreja, aos que têm medo ou aos indiferentes:
O Senhor também te chama para seres parte do seu povo, e o faz com grande respeito e amor!" EG, n.113.

sábado, 28 de fevereiro de 2015

"É a Mãe que, depois de o ter gerado, apresenta o Filho ao mundo. Ela dá-nos Jesus, ela mostra-nos Jesus, ela faz-nos ver Jesus."

PAPA FRANCISCO
AUDIÊNCIA GERAL
Sala Paulo VI
Quarta-feira, 7 de Janeiro de 2015


Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje continuamos com as catequeses sobre a Igreja e faremos uma reflexão sobre a Igreja mãe. A Igreja é mãe. A nossa Santa mãe Igreja.

 Nestes dias a liturgia da Igreja colocou diante dos nossos olhos o ícone da Virgem Maria Mãe de Deus. O primeiro dia do ano é a festa da Mãe de Deus, à qual se segue a Epifania, com a recordação da visita dos Magos. Escreve o evangelista Mateus: «Entrando na casa, acharam o menino com Maria, sua mãe. Prostrando-se diante dele, adoraram-no» (Mt 2, 11). É a Mãe que, depois de o ter gerado, apresenta o Filho ao mundo. Ela dá-nos Jesus, ela mostra-nos Jesus, ela faz-nos ver Jesus.

Continuamos com as catequeses sobre a família e na família há a mãe. Cada pessoa humana deve a vida a uma mãe, e quase sempre lhe deve muito da própria existência sucessiva, da formação humana e espiritual. Contudo, a mãe, embora seja muito exaltada sob o ponto de vista simbólico — muitas poesias, muitas coisas bonitas se dizem poeticamente sobre a mãe — é pouco escutada e pouco ajudada no dia-a-dia, pouco considerada no seu papel central na sociedade. Aliás, muitas vezes aproveita-se da disponibilidade das mães a sacrificar-se pelos filhos para «economizar» nas despesas sociais.

Acontece também que na comunidade cristã a mãe nem sempre é valorizada, é pouco ouvida. Todavia, no centro da vida da Igreja está a Mãe de Jesus. Talvez as mães, prontas para muitos sacrifícios pelos filhos, e frequentemente também pelos dos outros, deveriam ser escutadas. Seria necessário compreender melhor a sua luta quotidiana para serem eficientes no trabalho e diligentes e afetuosas em família; seria necessário compreender melhor quais são as suas aspirações a fim de expressar os frutos melhores e autênticos da sua emancipação. Uma mãe com os filhos tem sempre problemas, trabalhos. Lembro-me que em casa, éramos cinco filhos e enquanto um fazia uma travessura, o outro fazia outra, e a minha pobre mãe corria de um lado para o outro, mas era feliz. Deu-nos tanto.

As mães são o antídoto mais forte contra o propagar-se do individualismo egoísta. «Indivíduo» quer dizer «que não se pode dividir». As mães, ao contrário, «dividem-se», a partir do momento que hospedam um filho para o dar à luz e fazer crescer. São elas, as mães, que mais odeiam a guerra, que mata os seus filhos. Muitas vezes pensei naquelas mães quando receberam uma carta: «Digo-lhe que o seu filho morreu em defesa da pátria...». Pobres mulheres! Como sofre uma mãe! São elas que testemunham a beleza da vida. O arcebispo Oscar Arnulfo Romero dizia que as mães vivem um «martírio materno». 
Na homilia para o funeral de um sacerdote assassinado pelos esquadrões da morte, ele disse, fazendo eco ao Concílio Vaticano II: «Todos devemos estar dispostos a morrer pela nossa fé, ainda que o Senhor não nos conceda esta honra… Dar a vida não significa somente ser assassinado; dar a vida, ter espírito de martírio, é dar no dever, no silêncio, na oração, no cumprimento honesto do dever; naquele silêncio da vida quotidiana; dar a vida pouco a pouco? Sim, como a dá uma mãe que, sem temor, com a simplicidade do martírio materno, concebe no seu seio um filho, dando-o à luz, amamentando-o, fazendo-o crescer e cuidando dele com carinho. É dar a vida. É martírio». Termino aqui a citação. Sim, ser mãe não significa somente colocar um filho no mundo, mas é também uma escolha de vida. O que escolhe uma mãe, qual é a escolha de vida de uma mãe? A escolha de vida de uma mãe é a escolha de dar a vida. E isto é grande, é bonito.

Uma sociedade sem mães seria uma sociedade desumana, porque as mães sabem testemunhar sempre, mesmo nos piores momentos, a ternura, a dedicação, a força moral. As mães transmitem, muitas vezes, também o sentido mais profundo da prática religiosa: nas primeiras orações, nos primeiros gestos de devoção que uma criança aprende, está inscrito o valor da fé na vida de um ser humano. É uma mensagem que as mães que acreditam sabem transmitir sem tantas explicações: estas chegarão depois, mas a semente da fé está naqueles primeiros, preciosíssimos momentos. Sem as mães, não somente não haveria novos fiéis, mas a fé perderia boa parte do seu calor simples e profundo. E a Igreja é mãe, com tudo isso, é nossa mãe! Nós não somos órfãos, temos uma mãe! Nossa Senhora, a mãe Igreja e a nossa mãe. Não somos órfãos, somos filhos da Igreja, somos filhos de Nossa Senhora e somos filhos das nossas mães.


Queridas mães, obrigado, obrigado por aquilo que sois na família e por que o dais à Igreja e ao mundo. E a ti, amada Igreja, obrigado por ser mãe. E a ti, Maria, mãe de Deus, obrigado por nos fazer ver Jesus. E obrigado a todas as mães aqui presentes: saudemo-las com um aplauso!

Parabéns Mamães!
Que Nossa Senhora, a mãe de todas as mães interceda por todos nós!

«Pai» é uma palavra que todos conhecem, é uma palavra universal. Ela indica uma relação fundamental cuja realidade é antiga como a história do homem."

PAPA FRANCISCO
AUDIÊNCIA GERAL
Sala Paulo VI
Quarta-feira, 28 de Janeiro de 2015


Amados irmãos e irmãs, bom dia!
Retomamos o caminho das catequeses sobre a família. 

Hoje deixamo-nos guiar pela palavra «pai». Uma palavra que a nós cristãos é muito querida, porque é o nome com o qual Jesus nos ensinou a dirigir-nos a Deus: pai. O sentido deste nome recebeu uma nova profundidade precisamente a partir do momento em que Jesus o usava para se dirigir a Deus e manifestar a sua relação especial com Ele. O mistério bendito da intimidade de Deus, Pai, Filho e Espírito, revelado por Jesus, é o coração da nossa fé cristã.

«Pai» é uma palavra que todos conhecem, é uma palavra universal. Ela indica uma relação fundamental cuja realidade é antiga como a história do homem. Contudo, hoje chegou-se a afirmar que a nossa seria «uma sociedade sem pais». Noutros termos, sobretudo na cultura ocidental, a figura do pai estaria simbolicamente ausente, esvaecida, removida. Num primeiro momento, isto foi sentido como uma libertação: libertação do pai-patrão, do pai como representante da lei que se impõe de fora, do pai como censor da felicidade dos filhos e impedimento à emancipação e à autonomia dos jovens. Por vezes havia casas em que no passado reinava o autoritarismo, em certos casos até a prepotência: pais que tratavam os filhos como servos, sem respeitar as exigências pessoais do seu crescimento; pais que não os ajudavam a empreender o seu caminho com liberdade — mas não é fácil educar um filho em liberdade —; pais que não os ajudavam a assumir as próprias responsabilidades para construir o seu futuro e o da sociedade.

Certamente, esta não é uma boa atitude; mas, como acontece muitas vezes, passa-se de um extremo ao outro. O problema nos nossos dias não parece ser tanto a presença invadente dos pais, mas ao contrário a sua ausência, o seu afastamento. Por vezes os pais estão tão concentrados em si mesmos e no próprio trabalho ou então nas próprias realizações pessoais, que se esquecem até da família. E deixam as crianças e os jovens sozinhos. Quando eu era bispo de Buenos Aires apercebia-me do sentido de orfandade que vivem os jovens de hoje; e muitas vezes perguntava aos pais se brincavam com os seus filhos, se tinham a coragem e o amor de perder tempo com os filhos. E a resposta era feia, na maioria dos casos: «Mas, não posso, porque tenho tanto trabalho...». E o pai estava ausente daquele filho que crescia, não brincava com ele, não, não perdia tempo com ele.

Mas, neste caminho comum de reflexão sobre a família, gostaria de dizer a todas as comunidades cristãs que devemos estar mais atentos: a ausência da figura paterna da vida das crianças e dos jovens causa lacunas e feridas que podem até ser muito graves. Com efeito os desvios das crianças e dos adolescentes em grande parte podem estar relacionados com esta falta, com a carência de exemplos e de guias respeitáveis na sua vida de todos os dias, com a falta de proximidade, com a carência de amor por parte dos pais. É mais profundo de quanto pensamos o sentido de orfandade que vivem tantos jovens.
São órfãos na família, não dão aos filhos, com o seu exemplo acompanhado pelas palavras, aqueles princípios, aqueles valores, aquelas regras de vida das quais precisam como do pão. A qualidade educativa da presença paterna é tanto mais necessária quanto mais o pai é obrigado pelo trabalho a estar distante de casa. Por vezes parece que os pais não sabem bem que lugar ocupar na família e como educar os filhos. E então, na dúvida, abstêm-se, retiram-se e descuidam as suas responsabilidades, talvez refugiando-se numa relação improvável «ao nível» dos filhos. 

É verdade que deves ser «companheiro» do teu filho, mas sem esquecer que és o pai! Se te comportas só como um companheiro igual ao teu filho, isto não será bom para o jovem. E vemos este problema também na comunidade civil. A comunidade civil com as suas instituições, tem uma certa responsabilidade — podemos dizer paterna — em relação aos jovens, uma responsabilidade que por vezes descuida e exerce mal. 

Também ela muitas vezes os deixa órfãos e não lhes propõe uma verdadeira perspectiva. Assim, os jovens permanecem órfãos de caminhos seguros para percorrer, órfãos de mestres nos quais confiar, órfãos de ideais que aqueçam o coração, órfãos de valores e de esperanças que os amparem diariamente. Talvez sejam ídolos em abundância mas é-lhes roubado o coração; são estimulados a sonhar divertimentos e prazeres, mas não lhes é dado trabalho; são iludidos com o deus dinheiro, mas são-lhes negadas as verdadeiras riquezas.

E então fará bem a todos, aos pais e aos filhos, ouvir de novo a promessa que Jesus fez aos seus discípulos: «Não vos deixarei órfãos» (Jo 14, 18). De fato, Ele é o Caminho a percorrer, o Mestre a ouvir, a Esperança de que o mundo pode mudar, de que o amor vence o ódio, que pode haver um futuro de fraternidade e de paz para todos. Algum de vós poderia dizer-me: «Mas Padre, hoje foi demasiado negativo. Só falou da ausência dos pais, do que acontece quando os pais não acompanham o crescimento dos filhos... É verdade, quis frisar isto, porque na próxima quarta-feira continuarei esta catequese pondo em evidência a beleza da paternidade. Por isso escolhi começar pela escuridão para chegar à luz. Que o Senhor nos ajude a compreender bem estas coisas. Obrigado.

Que o pai esteja presente na família. Que se encontre próximo da esposa, para compartilhar tudo, alegrias e dores, dificuldades e esperanças"

PAPA FRANCISCO
AUDIÊNCIA GERAL
Sala Paulo VI
Quarta-feira, 4 de Fevereiro de 2015

Hoje gostaria de apresentar a segunda parte da reflexão sobre a figura do pai de família. Na última catequese falei sobre o perigo dos pais «ausentes», e hoje quero considerar acima de tudo o aspecto positivo. Também são José teve a tentação de deixar Maria, quando descobriu que ela estava grávida; mas interveio o anjo do Senhor, que lhe revelou o desígnio de Deus e a sua missão de pai putativo; e José, homem justo, «recebeu em casa a sua esposa» (Mt1, 24), tornando-se o pai da família de Nazaré.

Todas as famílias têm necessidade do pai. Hoje meditamos sobre o valor do seu papel, e gostaria de começar com algumas expressões que se encontram no Livro dos Provérbios, palavras que um pai dirige ao próprio filho, dizendo assim: «Meu filho, se o teu espírito for sábio, o meu coração alegrar-se-á contigo! Os meus rins estremecerão de alegria, quando os teus lábios proferirem palavras retas» (Pr 23, 15-16). Não se poderia expressar melhor o orgulho e a emoção de um pai que reconhece que transmitiu ao seu filho aquilo que realmente conta na vida, ou seja, um coração sábio. Este pai não diz: «Sinto-me orgulhoso de ti, porque és precisamente igual a mim, repetes as palavras que pronuncio e aquilo que faço». 

Não, não se limita simplesmente a dizer-lhe algo. Diz-lhe uma coisa muito mais importante, que poderíamos interpretar assim: «Serei feliz cada vez que te vir agir com sabedoria e comover-me-ei todas as vezes que te ouvir falar com retidão. Foi isto que desejei deixar-te, para que se tornasse algo teu: a atitude de ouvir e agir, de falar e julgar com sabedoria e retidão. E para que pudesses ser assim, ensinei-te coisas que não sabias, corrigi erros que não vias. Fiz-te sentir um afago profundo e ao mesmo tempo discreto, que talvez não tenhas reconhecido plenamente quando eras jovem e incerto. Dei-te um testemunho de rigor e de firmeza que talvez não entendesses, quando só querias cumplicidade e tutela. Fui o primeiro que tive de me pôr à prova da sabedoria do coração e velar sobre os excessos do sentimento e do ressentimento, para poder carregar o peso das incompreensões inevitáveis e encontrar as palavras certas para me fazer entender.


Agora — continua o pai — comovo-me quando vejo que tu procuras comportar-te assim com os teus filhos e com todos. Estou feliz por ser teu pai!». É isto que diz um pai sábio, um pai maduro.
Um pai sabe bem quanto custa transmitir esta herança: quanta proximidade, quanta meiguice e quanta firmeza. No entanto, que consolação e recompensa se recebe, quando os filhos honram esta herança! É uma alegria que compensa todos os esforços, que supera qualquer incompreensão e cura todas as feridas.

Portanto, a primeira necessidade é precisamente esta: que o pai esteja presente na família. Que se encontre próximo da esposa, para compartilhar tudo, alegrias e dores, dificuldades e esperanças. E que esteja perto dos filhos no seu crescimento: quando brincam e quando se aplicam, quando estão descontraídos e quando se sentem angustiados, quando se exprimem e quando permanecem calados, quando ousam e quando têm medo, quando dão um passo errado e quando voltam a encontrar o caminho; pai presente, sempre. Estar presente não significa ser controlador, porque os pai demasiado controladores anulam os filhos e não os deixam crescer.

O Evangelho fala-nos da exemplaridade do Pai que está nos céus — o único, diz Jesus, que pode chamar-se verdadeiramente «Pai bom» (cf. Mc 10, 18). Todos conhecem a extraordinária parábola denominada do «filho pródigo», ou melhor, do «pai misericordioso», que se lê no capítulo 15 do Evangelho de Lucas (cf. 15, 11-32). Quanta dignidade e quanta ternura na expectativa daquele pai que está à porta de casa, à espera do regresso do filho! Os pais devem ser pacientes. Muitas vezes nada se pode fazer, a não ser esperar; rezar e esperar com paciência, doçura, generosidade e misericórdia.

Um pai bom sabe esperar e perdoar, do profundo do coração. Sem dúvida, também sabe corrigir com firmeza: não se trata de um pai fraco, complacente, sentimental. O pai que sabe corrigir sem aviltar é o mesmo que sabe proteger sem se poupar. Certa vez ouvi numa festa de casamento um pai dizer: «Às vezes tenho que bater um pouco nos filhos... mas nunca no rosto, para não os humilhar». Que bonito! Tem o sentido da dignidade. Deve punir, mas fá-lo de modo correto e vai em frente.

Por conseguinte, se alguém pode explicar até ao fundo a oração do «Pai-Nosso» ensinada por Jesus, é precisamente quem vive pessoalmente a paternidade. Sem a graça do Pai que está nos céus, os pais perdem a coragem e abandonam o campo. Mas os filhos têm necessidade de encontrar um pai que os espera quando voltam dos seus fracassos. Farão de tudo para não o admitir, para não o revelar, mas precisam dele; quando não o encontram, abrem-se-lhes feridas difíceis de cicatrizar.

A Igreja, nossa mãe, está comprometida em apoiar com todas as suas forças a presença boa e generosa dos pais nas famílias, porque para as novas gerações eles são guardiões e mediadores insubstituíveis da fé na bondade, da fé na justiça e da salvaguarda de Deus, como são José.

«Irmão» e «irmã» são palavras que o cristianismo aprecia muito. E, graças à experiência familiar, são palavras que todas as culturas e épocas compreendem.

"Ter um irmão, uma irmã que nos ama é uma experiência forte, inestimável, insubstituível." 

«Como é bom, como é agradável os irmãos viverem em unidade!» (Sl 133 [132], 1)
PAPA FRANCISCO
AUDIÊNCIA GERAL
Praça de São Pedro
Quarta-feira, 18 de Fevereiro de 2015

Prezados irmãos e irmãs, bom dia! 

Depois de falar sobre as mães e os pais, hoje refletiremos sobre os filhos. Esses são a alegria de uma família e de uma sociedade. Não podem jamais ser vistos como propriedade dos pais: os filhos são um dom. Por isso, devem ser amados por aquilo que são; não por serem bonitos, saudáveis, ou por serem o reflexo de seus pais. Sentindo-se amados pelos pais, os filhos podem descobrir a dimensão mais gratuita do amor: a beleza de ser amados, antes de fazerem algo para o merecer. À luz do quarto Mandamento, vemos que uma sociedade onde os filhos não honram os seus pais, é uma sociedade condenada a encher-se de jovens frios e ambiciosos. Mas, uma sociedade que não quer se circundar de filhos, pois os considera um peso, uma preocupação, é uma sociedade deprimida. É preciso ter a convicção de que a vida se rejuvenesce e adquire novas energias, justamente ao multiplicar-se. Por fim, é olhando para Jesus, o Filho, que nós aprenderemos como ser melhores filhos com os nossos pais na terra e com o nosso Pai do Céu.
No nosso caminho de catequeses sobre a família, depois de ter meditado sobre o papel da mãedo pai e dos filhos, agora é a vez dos irmãos. «Irmão» e «irmã» são palavras que o cristianismo aprecia muito. E, graças à experiência familiar, são palavras que todas as culturas e épocas compreendem.


O laço fraternal ocupa um lugar especial na história do povo de Deus, que recebe a sua revelação no vivo da experiência humana. O salmista canta a beleza do vínculo fraterno: «Como é bom, como é agradável os irmãos viverem em unidade!» (Sl 133 [132], 1). E é verdade, a irmandade é bonita! Jesus Cristo levou à sua plenitude também esta experiência humana do ser irmãos e irmãs, assumindo-a no amor trinitário e fortalecendo-a para que vá muito além dos vínculos de parentela e possa superar todos os muros de alienação.

Sabemos que quando a relação fraternal se corrompe, quando se desvirtua o relacionamento entre os irmãos, abre-se o caminho para dolorosas experiências de conflito, traição e ódio. A narração bíblica de Caim e Abel constitui o exemplo deste resultado negativo. Após o assassínio de Abel, Deus pergunta a Caim: «Onde está o teu irmão Abel?» (Gn 4, 9a). É uma interrogação que o Senhor continua a repetir a cada geração. E infelizmente, em cada geração, não cessa de se repetir também a dramática resposta de Caim: «Não sei. Sou porventura eu o guarda do meu irmão?» (Gn 4, 9b). A ruptura do vínculo entre irmãos é algo desagradável e negativo para a humanidade. 
Também em família, quantos irmãos discutem por causa de coisas insignificantes, ou de uma herança, e depois deixam de se comunicar, de se saudar uns aos outros. Isto é feio! A
 fraternidade é algo grandioso, quando se pensa que todos os irmãos habitaram no ventre da mesma mãe, durante nove meses, e vêm da carne da mesma mãe! E não se pode interromper a fraternidade. Pensemos um pouco: todos nós conhecemos famílias com irmãos divididos, que discutiram; peçamos ao Senhor por estas famílias — talvez na nossa família haja alguns casos — que as ajude a reunir os irmãos, a reconstruir a família. A fraternidade não se deve interromper, porque quando se interrompe, verifica-se o que aconteceu com Caim e Abel. Quando o Senhor pergunta a Caim onde estava o seu irmão, ele responde: «Não sei, não me interesso pelo meu irmão!». Isto é desagradável, é algo muito doloroso de ouvir. Nas nossas preces oremos sempre pelos irmãos que se dividiram.

O laço de fraternidade que se forma em família, entre os filhos, quando se verifica num clima de educação para a abertura ao próximo, é uma grande escola de liberdade e paz. Em família, entre irmãos, aprendemos a convivência humana, como devemos conviver na sociedade. Talvez nem sempre estejamos conscientes disto, mas é precisamente a família que introduz a fraternidade no mundo! A partir desta primeira experiência de fraternidade, alimentada pelos afetos e pela educação familiar, o estilo da fraternidade irradia-se como uma promessa sobre a sociedade inteira e sobre as relações entre os povos.

A bênção que Deus, em Jesus Cristo, derrama sobre este vínculo de fraternidade dilata-o de modo inimaginável, tornando-o capaz de ultrapassar todas as diferenças de nação, língua, cultura e até de religião.
Pensai no que se torna o vínculo entre os homens, mesmo que sejam muito diversos entre si, quando podem dizer uns aos outros: «Para mim, ele é como um irmão, ela é como uma irmã!». Isto é bonito! De resto, a história demonstrou suficientemente que, sem a fraternidade, até a liberdade e a igualdade podem encher-se de individualismo e conformismo, também de interesse pessoal.

A fraternidade em família resplandece de modo especial quando vemos o esmero, a paciência e o carinho com os quais são circundados o irmãozinho ou a irmãzinha mais frágeis, doentes ou deficientes. Os irmãos e as irmãs que agem assim são muitíssimos, no mundo inteiro, e talvez não apreciemos de modo suficiente a sua generosidade. E quando numa família os irmãos são numerosos — hoje saudei uma família com nove filhos: o mais velho ou a mais velha ajuda o pai, a mãe, a cuidar dos mais pequeninos. Como é bonito este trabalho de ajuda entre os irmãos!

Ter um irmão, uma irmã que nos ama é uma experiência forte, inestimável, insubstituível. Acontece o mesmo com a fraternidade cristã. Os mais pequeninos, frágeis e pobres devem enternecer-nos: eles têm o «direito» de arrebatar a nossa alma, o nosso coração. Sim, eles são nossos irmãos, e como tais devemos amá-los e tratá-los. Quando isto acontece, quando os pobres vivem como em casa, a nossa fraternidade cristã retoma vida. Com efeito, os cristãos vão ao encontro dos mais pobres e frágeis não para seguir um programa ideológico, mas porque a palavra e o exemplo do Senhor nos dizem que somos todos irmãos. Este é o princípio do amor de Deus e de toda a justiça entre os homens. Sugiro-vos algo: antes de concluir, só me faltam poucas linhas, cada um de nós pense nos próprios irmãos e irmãs e, no silêncio do coração, reze por eles. Um momento de silêncio!

Eis que com esta prece os trouxemos todos, irmãos e irmãs, com o pensamento, com o coração, aqui à praça para receber a bênção. Hoje é mais necessário do que nunca repor a fraternidade no centro da nossa sociedade tecnocrática e burocrática: assim, também a liberdade e a igualdade tomarão a sua correta modulação. Por isso, não privemos com leviandade as nossas famílias, por sujeição ou medo, da beleza de uma ampla experiência fraternal de filhos e filhas. E não percamos a nossa confiança na vastidão de horizonte que a fé é capaz de obter desta experiência, iluminada pela Bênção de Deus.

SANTA HILDEGARDA DE BINGEN - DOUTORA DA IGREJA

Bento XVI proclamou em 07.04.2012 Doutores da Igreja: Santa Hildegarda de Bingen e São João de Ávila.

Hildegarda de Bingen, Abadessa beneditina (1078-1179) e o padre espanhol João de Ávila (1500-1569).

O título de Doutor da Igreja Universal é conferido àqueles santos e santas, como precisamente Santa Hildegarda de Bingen e São João D'Ávila, que, com a sua eminente doutrina, contribuiram ao aprofundamento do conhecimento da Revelação Divina , enriquecendo o patrimônio teológico da Igreja e ajudando os fieis a crescerem na fé e na caridade.
De um ponto de vista teológico, os Doutores da Igreja evidenciam aspectos inéditos da verdade evangélica. De um ponto de vista pastoral, suscitam nos fieis um renovado apelo à coerência de vida.- Pode dizer alguma coisa sobre a "eminente doutrina" de Hildegarda de Bingen?
- A benedetina alemã Hildegarda de Bingen, fundadora e abadesa de dois mosteiros, nas suas obras enuncia uma doutrina exímia por profundidade, originalidade e fidelidade à revelação. Animada por uma autêntica caridade intelectual, ela ilustra com densidade de conteúdo e frescura de linguagem o mistério de Deus Trindade, da Encarnação, da Igreja, da Humanidade. Para Hildegarda, por exemplo, o ser humano é visto como uma unidade corpo-alma com uma admiração positiva da corporeidade por ordem de mérito. Que o corpo não tenha sido concedido ao Homem apenas como um peso demonstra-nos o facto que as almas dos santos desejam ardentemente a reunificação com o seu corpo mortal. Por consequência, o cumprimento escatológico significa uma transformação e uma ressurreição do corpo para a vida eterna.

A história da vida de uma das personalidades femininas mais fascinantes da Idade Média. Escritora, compositora e autora teatral, pedagoga e reformadora monástica; como mística, Hildegarda foi uma freira beneditina à frente do seu tempo, que criou uma abordagem humanista à devoção e tornou-se revolucionária do amor, baseando sua vida em uma misteriosa inspiração.

ASSISTA O FILME:
www.youtube.com/watch?v=_aTLe4xZvAM&index=44&list=PLVTWROeuEmCJpRRuv9tBa2m4-IHoC6g2O

O Papa destaca contribuição inteligente e sensível das mulheres à teologia.


VATICANO, 08 Set. 10 / 01:17 pm (ACI).- O Papa Bento XVI dedicou sua catequese das quartas-feiras a seguir refletindo sobre a mística alemã Santa Hildegarda de Bingen e destacou a peculiar contribuição das mulheres à teologia na história.

O Santo Padre explicou desde a Sala Paulo VI que em contribuições como as de Santa Hildegarda "vemos como a teologia também pode receber uma contribuição peculiar das mulheres, porque são capazes de falar de Deus e dos mistérios da fé com sua inteligência e sensibilidade próprias".

Neste sentido, o Papa alentou a "todas as que desenvolvem este serviço a realizá-lo com profundo espírito eclesiástico, alimentando a própria reflexão com a 
oração e tendo em conta a grande riqueza, ainda em parte inexplorada, da tradição mística medieval, sobre tudo aquela representada por modelos luminosos como Hildegarda de Bingen".

Falando sobre a santa Hildegarda de Bingen, o Pontífice recordou que ela "distinguiu-se por sua santidade de 
vida e sua sabedoria espiritual". Sublinhou que as visões místicas das que gozou durante sua vida, "eram ricas em conteúdo teológico. Fazem referência aos principais acontecimentos da história da salvação, e usam uma linguagem principalmente poética e simbólica. Por exemplo, em sua obra mais famosa, titulada ‘Scivias’, quer dizer, ‘Conheça as vias’, resume em trinta e cinco visões os eventos da história da salvação, da criação do mundo ao fim dos tempos. Na parte central de sua obra desenvolve o tema do matrimônio místico entre Deus e a humanidade realizado na Encarnação".

Falando de outros escritos da Santa, o Papa recordou "o "Liber vitae meritorum" (Livro dos méritos da vida) e o "Liber divinorum operum" (Livro das obras divinas), também chamado "De operatione Dei". No primeiro, "sublinha a profunda relação entre o homem e Deus e nos recorda que toda a criação, da qual o ser humano é a cúpula, recebe a vida da Trindade". No segundo, "considerado por muitos sua obra mestra, descreve a criação em sua relação com Deus e a centralidade do homem, com um forte cristocentrismo de sabor bíblico-patrístico".

O Santo Padre assinalou que Hildegarda "ocupou-se da medicina e das ciências naturais, assim como da música. Para ela, toda a criação é uma sinfonia do Espírito Santo, que é em si mesmo alegria e júbilo".

"A popularidade de Hildegarda levava muitas pessoas a consultar-lhe coisas. Dirigiam-se a ela comunidades monásticas de homens e mulheres, 
bispos e abades. Muitas das respostas seguem sendo válidas para nós", acrescentou.

O Santo Padre afirmou que "com a autoridade espiritual da que estava dotada, Hildegarda viajou nos últimos anos de sua vida. Todos a escutavam com gosto, inclusive quando utilizava um tom severo: consideravam-na uma mensageira enviada Por Deus. Recordava sobre tudo às comunidades monásticas e ao clero que deveriam viver conforme sua vocação”.

“Em particular, Hildegarda contrastou o movimento dos cátaros alemães. Os cátaros -que literalmente significa ‘puros’-, propugnavam uma reforma radical da 
Igreja, sobre tudo para combater os abusos do clero. Ela os repreendeu com força por querer subverter a natureza mesma da Igreja, recordando-lhes que uma verdadeira renovação da comunidade eclesiástica não se consegue tanto com a mudança das estruturas, como com um sincero espírito de penitência e um caminho contínuo de conversão. Esta é uma mensagem que nunca devemos esquecer".

"Invoquemos sempre o Espírito Santo para que suscite na Igreja mulheres santas e valentes, como santa Hildegarda de Bingen, que apreciando os dons recebidos de Deus, contribuam sua preciosa e peculiar contribuição para o crescimento espiritual de nossas comunidades e da Igreja em nosso tempo", concluiu.

 Sua trilogia teológica
Liber scivias Domini

Primeira visão do Liber scivias Domini.
Iluminura do Scivias mostrando a estrutura do cosmos.
Seu primeiro livro descrevendo suas visões, o Liber scivias Domini, cujo título é uma abreviação de Scito vias Domini (Conhecei os caminhos do Senhor), foi escrito entre 1141 e 1151 e foi em sua vida o mais conhecido e apreciado. Foi o livro cujo esboço o papa Eugênio III leu e aprovou, trazendo-lhe uma fama imediata. O público pretendido por Hildegarda para ele foi o dos clérigos e monges, com um intuito de corrigir sua indolência, como lhe ordenou Deus: "Mostrai-lhes a inutilidade dos mistérios que eles, tímidos como são, escondem em um campo oculto e estéril. Jorrai como uma fonte de abundância, e inundai-os com o conhecimento místico, até que eles, que agora te julgam desprezível por causa do erro de Eva, renasçam com as grandes águas de tua irrigação".57 É uma obra alentada dividida em três volumes, contendo cada um, respectivamente, seis, sete e treze visões. O primeiro volume abre com uma descrição do Reino dos Céus. O principal tema dessa parte é a origem do pecado no mundo, explicada como advinda da rebelião de Lúcifer e a consequente queda de Adão e Eva. Então segue o exame das consequências disso para o mundo e para a humanidade. Em alguns pontos ela antecipou o remédio para o mal, que seria a Encarnação de Cristo, mas não a inseriu numa perspectiva cronológica. Antes trabalhou sobre o contraste entre a Sinagoga, ou a Antiga Dispensação, e a Igreja, a Nova Dispensação, e a visão final do primeiro volume aborda as hierarquias angélicas. A temática do segundo volume é a obra divina da redenção da humanidade, falando sobre a vinda de Cristo, as pessoas da Trindade e sobre a eclesiologia, incluindo seções sobre as virtudes dos Sacramentos. O volume final retoma os temas principais abordados antes numa perspectiva mais vasta, histórica e arquitetural, recapitulando as etapas da queda e da salvação do homem, tanto coletiva como individualmente. Estabelece um painel do Juízo Final e encerra com 14 peças musicais em forma de um pequeno drama sacro que compõem a primeira versão do auto musicado Ordo Virtutum, coroando de forma dramática sua descrição da origem e destino final do homem com uma ilustração teatral e musical das beatitudes do Paraíso.58 A seguir se transcrevem, a título de ilustração, dois trechos da IV Visão do II Volume, referente o primeiro à descrição simbólica da Igreja, e o segundo à explicação dada pela voz que ouvia:
"Então eu vi como se fosse uma imensa torre circular inteiramente construída de pedra branca, com três janelas no topo, de onde saía uma luz tão clara que até mesmo o teto cônico da torre parecia translúcido. As janelas eram decoradas com as mais belas esmeraldas. E esta torre estava colocada como que no dorso da imagem da mulher (a Igreja) que já citei, como uma torre que é construída na muralha de uma cidade, de forma que a imagem não poderia de forma alguma ser abalada por causa de sua solidez e força…"
"Pois a razão pela qual viste uma grande torre redonda toda feita de pedra branca é porque a suavidade do Espírito Santo é imensa e engloba totalmente todas as criaturas em sua graça, de modo que nenhuma corrupção na integridade da plenitude da sua justiça a pode destruir; e, brilhando, indica o caminho e emana todos os rios de santidade na claridade de sua força, onde não se pode achar mácula alguma de insensatez. Portanto o Espírito Santo é um fogo cuja ardente serenidade, acendendo as virtudes ígneas, jamais será destruída e assim afugenta toda a escuridão".59
Neste livro ela introduziu o conceito da viriditas, que percorre todas as suas outras obras, significando literalmente "verdor", mas que é empregado tanto no sentido da cor verde das plantas como no de ser uma qualidade vivificante do Espírito Santo que é infusa em toda a Criação. Como obra visionária, segundo o que pensam Bishop & Hart, o Scivias é único, e como suma de doutrina se alinha à melhor produção de seu tempo, comparável às obras de um influente contemporâneo seu, Hugues de Saint-Victor, particularmente ao Sobre os Sacramentos da Fé Cristã, que é em muito similar. Mas o tom da narrativa é todo diferente: enquanto que Hugues fez uma meditação privada em seu próprio nome, Hildegarda não raro falou em nome de Deus. Seu estilo de escrita sofre com um latim um tanto desajeitado, não obstante o monge Volmar tê-lo revisado e corrigido. O Scivias pode ser lido de uma variedade de maneiras - como uma proclamação profética, um livro de alegorias, um estudo de exegese e uma suma teológica. Cada visão era acompanhada, no manuscrito original definitivo de c. 1165 produzido em Rupertsberg, por uma iluminura, elaboradas por algum de seus assistentes, sob a sua direta supervisão, e são tão originais em seu estilo plástico quanto o conteúdo e o estilo textual de Hildegarda. Esse manuscrito foi perdido na II Guerra Mundial, mas por fortuna em 1927 havia sido feita uma cópia fac-similar em pergaminho, preparada pelas monjas de Eibingen. 60
Liber vitae meritorum
O segundo livro de visões, Liber vitae meritorum, é um tratado de ética que trabalha sobre a oposição entre os vícios e as virtudes, um tema que era comum em sua época. O texto é dominado por uma figura monumental que representa Cristo ou Deus. Ela reaparece ao longo das visões; seus pés assentam no abismo das águas e a cabeça se perde no éter, enquanto que nuvens ígneas de virtudes emanam de sua boca. As virtudes não são vistas individualmente, mas sua voz é ouvida, ou são representadas por símbolos. Os vícios são descritos em formas grotescas que misturam partes humanas e animais, e falam uma linguagem muito grosseira mas muito sedutora. Parte do sucesso deste livro vem de sua habilidade no dar voz àquelas entidades abstratas em diálogos de grande eficiência. Trinta e cinco virtudes são contrapostas a trinta e cinco vícios, e as visões concluem por enfatizar a responsabilidade e a liberdade do homem na escolha de seu caminho e informam sobre as consequências de sua opção. O livro também oferece um painel das práticas penitenciais de seu tempo, e é muito possível que tenha sido usado como um manual prático para as monjas não só de Rupertsberg, mas também dos mosteiros de Gembloux e Villiers. Outra característica interessante do texto é ter sido um dos primeiros tratados de ética religiosa a incluir uma detalhada descrição e explicação do Purgatório, cuja doutrina há pouco havia sido formulada.61 62
Liber divinorum operum
A trilogia se encerra com o seu Liber divinorum operum, escrito quando Hildegarda já tinha mais de sessenta anos de idade e já era famosa como escritora e conselheira espiritual. O livro é um vasto painel de toda a criação divina, e aborda três temas principais: o mundo da humanidade, o mundo além e a história da salvação desde Adão e Eva até o Juízo Final. Seu esquema narrativo é o mesmo do Scivias: uma visão introduz cada nova seção principal, e que é descrita em detalhe. Depois uma voz desce do céu para explicar o significado do que foi visto. Embora o conteúdo revelado sobrenaturalmente tenha a clara primazia em termos de autoridade, Hildegarda não se furtou de acrescentar inúmeros comentários próprios que dão explicações mais claras ou enfatizam algum ponto importante. Como a maioria dos teólogos de seu tempo, Hildegarda via nas Escrituras mais do que seu significado literal e histórico, e buscava sua explicação profunda através de leituras simbólicas, moralizantes e alegóricas. Ao final de cada seção aparece um exortação para que o leitor use o texto de moto para suas penitências e meditações, e o livro como um todo é fechado com uma severa advertência para que futuros copistas não acrescentem ou removam uma só letra ao que foi escrito, sob pena de o autor de tal profanação cometer um pecado contra o Espírito Santo - imperdoável - e ser excluído do Livro da Vida de Deus. O manuscrito que contém as iluminuras, o Codex 1942 da Biblioteca Estatal de Lucca, é posterior à sua morte, mas parece copiar a fonte original. O livro se abre com a figura alada monumental da Caridade/Amor, que engloba em si todo o universo criado.63 64 Diz ela:
Caritas, a primeira visão do Liber divinorum operum.
Liber divinorum operum: o homem divino.
"Eu sou a suprema e incandescente força que acendeu todas as centelhas vivas, e eu não criei coisa alguma morta… e eu sou a vida ígnea da essência de Deus: Eu ardo acima da beleza dos campos, eu brilho nas águas, eu queimo no sol, na lua e nas estrelas… Sou também a Razão. É meu o trovão da sonora Palavra pela qual toda criação veio à existência, e eu animei todas as coisas com meu alento de modo que nenhuma é mortal em seu gênero, pois eu sou a Vida".65
Boa parte do livro está concentrada na descrição da constituição e forma do ser humano, compreendendo seu corpo físico e sua alma, correlacionando a forma humana com vários aspectos do microcosmo e do macrocosmo, como ilustração de um extenso comentário aos 14 primeiros versículos do Evangelho de São João e ao livro do Gênesis. Todas as partes do corpo são carregadas de simbolismo.63 Um exemplo:
"A esfera do crânio indica o poder dominante da humanidade… Deus revela através de nossos olhos o conhecimento pelo qual Deus prevê e conhece tudo de antemão… Deus se nos revela através de nossa habilidade de ouvir todos os sons da glória sobre os mistérios ocultos… pelo nosso nariz Deus mostra a sabedoria que reside como um oloroso senso de ordem em todas as obras de arte… por nossa boca Deus indica a Palavra divina, a Palavra pela qual Deus criou todas as coisas…".66
A forma humana é vista, pois, como o modelo divino da Encarnação, de acordo com o conceito básico apresentado no Gênesis, e é louvada como uma manifestação da vitalidade, amor e beleza de Deus. Corpo e alma são concebidos como uma unidade integral, onde as forças da natureza e do espírito interagem em harmonia, e servem como um espelho e objetivo para toda a obra da Criação. "Deus inscreveu toda sua obra na forma humana", escreveu. Assim a criação do universo estava ligada indissoluvelmente à criação da forma humana, e mais do que isso, aquela estava quase que subordinada a esta, já que para Hildegarda a Encarnação do Verbo divino estava prevista desde antes do Tempo e a forma humana serviria como o instrumento privilegiado para a reunião da criatura com o Criador após o longo trajeto desde a origem do universo até sua redenção.63
Ao mesmo tempo, dizia que a vida que animava o homem era a mesma que animava todo o universo, e que o universo criado era a luz do homem, significando que o trabalho da Redenção estava na dependência do entendimento do mundo, e por consequência, do entendimento da vontade divina. Nesse sentido, até mesmo as paixões humanas, tantas vezes condenadas por outros escritores cristãos de sua época, eram vistas como parte integral do plano divino. Entretanto, ela não foi muito além do reconhecimento e aceitação puros e simples do estado de coisas da humanidade, pois numa perspectiva ideal ainda pensava que o ser humano devia aspirar à reconquista da inocência edênica, o que necessariamente excluía toda a sexualidade. Tendo de administrar ideal e real, concebeu uma teoria da sexualidade muito sutil e ambígua, e de certa forma precária. Comparando o desejo humano à fertilidade da terra, reconhecia que ele dava à luz uma pletora de riquezas, e também que o sexo era fonte de prazer, mas via o corpo como um instrumento da alma que devia ser disciplinado para que se formasse uma cooperação entre ambos, potencialmente confortável e prazerosa, e para que o objetivo primeiro da salvação da alma pudesse ser alcançado.67 Escreveu:
"E assim a alma diz depois de sua vitória: Oh minha carne, e vós, meus membros, onde fiz minha morada! Quanto me regozijo de ter sido enviada a vós, e de ver que estais em acordo comigo, e que com isso me encaminheis para minha recompensa eterna!"68
O Liber divinorum termina com uma seção dedicada à escatologia, pintando o Juízo Final em cores escuras, provavelmente estando Hildegarda abalada com o cisma de 1159. Embora em suas cartas ela se recusasse a comentar o assunto, alegando ter sido proibida por Deus de fazê-lo, alusões a um cisma, ainda que inespecífico, são claras no final do livro, colocando a imagem da Justiça a invectivá-lo sonoramente. Também o clero não aparece sob uma luz favorável, sendo acusado de muitos vícios e de submersão nos assuntos mundanos. O tom do livro é bem mais pesado que o do Scivias, mas a estrutura do cosmos que dele emerge é muito mais poderosamente organizada.69
Ciência natural
Sobre este tema Hildegarda escreveu o Liber subtilitatum diversarum naturarum creaturarum, (Livro das propriedades - ou sutilezas - das várias criaturas da natureza), dividido em Physica (Liber simplices medicinae) (Física - Livro da medicina simples) e Causae et curae (Liber compositae medicinae) (Causas e curas - Livro da medicina complexa). Não se sabe como ela veio a adquirir seu conhecimento; sua atividade como médica foi toda informal e sua formação nesse campo aconteceu provavelmente de forma autodidata, mas ela pode ter recebido uma base terapêutica prática com Jutta e os monges de Disibodenberg durante seu noviciado. Fazia parte das obrigações das superioras conventuais velar pela saúde de suas monjas, mas a prática profissional do ofício exigia formação universitária, o que era vedado às mulheres.34 Seja como for, pelo conteúdo do tratado se infere que ela estava familiarizada com a medicina de Galeno, de Hipócrates, as práticas árabes e o curandeirismo tradicional alemão, e deve ter ampliado seus conhecimentos com a prática de atendimento a doentes no seu mosteiro. Também deve ter conhecido as obras de naturalistas antigos como Plínio, o Velho e Isidoro de Sevilha, bem como os bestiários e livros de maravilhas de sua época, e as teorias dos temperamentos, dos fluidos corporais e dos humores, estabelecidas desde a Antiguidade, mas fez muitas observações originais e inventou diversas terapias novas. O texto traça um panorama abrangente das práticas medicinais disponíveis em sua época, derivadas das tradições pagãs greco-romanas, muçulmanas, cristãs efolclóricas, e fica clara sua concepção de que a natureza e o homem são espelhos mútuos e integrados. O Liber subtilitatum foi o primeiro livro de ciência natural escrito no Sacro Império Romano-Germânico, permanecendo uma influência para o estudo da Botânica na Europa do norte até o século XVI, mas ainda espera dos pesquisadores estudos mais detidos que o posicionem mais corretamente no contexto do desenvolvimento da ciência e medicina medievais.24 70 Suas ideias têm sido apontadas como uma referência para os adeptos modernos damedicina holística.44
As estações e o cultivo da terra, iluminura do Liber divinorum operum.
A primeira parte tem o caráter de uma enciclopédia e descreve as propriedades dos elementos naturais como os rios e lagos, o ar e a terra, as pedras preciosas, plantas, animais e minerais, na perspectiva de seu uso medicinal pelo homem. O texto não é visionário, mas a interpretação das propriedades desses elementos se encaixa em sua teologia geral, avaliando a natureza sob premissas cristãs. Considerava que ela fora desvirtuada através da queda de Adão e Eva, mas identificava vários domínios naturais ainda intactos e portadores de um valor sacramental. Muitas das práticas terapêuticas que ela descreveu têm um interesse apenas histórico, mas outras foram confirmadas pela ciência moderna e permanecem válidas. Também assinalou a importância do conhecimento do natural para o bem-estar do homem, e a necessidade do uso das forças da natureza em aliança com a graça salvífica de Cristo, sempre atribuindo o resultado da intervenção terapêutica à vontade divina. Para ela bênçãos e maldiçõestinham uma realidade concreta, e muitas de suas práticas curativas traziam um elemento de magia ou de prece. Um exemplo é sua receita para curar a loucura nascida de uma maldição, onde recomendou que se passasse uma certa pedra preciosa através de uma fenda em forma de cruz aberta na casca de um pão aquecido, enquanto o terapeuta devia recitar as palavras: "Deus, que privou o diabo de todas as pedras preciosas, se este mandamento foi quebrado, remova de (fulano) todas as fantasias e palavras mágicas, levando com elas o sofrimento da loucura".71
Causae et curae tem uma estrutura bem mais frouxa e um conteúdo mais heteróclito, e aparentemente nunca recebeu uma redação definitiva pela autora; possivelmente foi compilado como um manual prático para seu uso pessoal. Traz uma miscelânea de tradições folclóricas sobre Adão e Eva, notas astrológicas, mas sobretudo enfoca o corpo humano, estudando sua anatomia e fisiologia.72 Para Hildegarda boa parte das doenças do homem derivam das consequências do pecado original, da perda da harmonia e moderação primitivas e da integração entre Criador, natureza e criatura, e se recusava a ver a doença como um assunto exclusivamente de ordem física, fazendo constantes conexões entre os males que afligiam a alma e aqueles de que padecia o corpo.73 Ademais, também deu instruções sobre higiene geral e para as gestantes e mães, e com uma franqueza inédita em sua época, abordou a sexualidade e suas disfunções, provendo remédios para elas. Fez também uma detalhada análise do desejo e do prazer, e embora visse o ato sexual e o prazer positivamente, comparando-os à música, e o corpo humano a um instrumento musical, muito de sua apreciação positiva é obscurecida na análise e condenação da luxúria.71 74 Via o relacionamento entre homem em mulher - num sentido lato - essencial para a própria definição de seus gêneros, e, como assinalou Heinrich Schipperges, para Hildegarda
"Homem e mulher foram atraídos um para o outro desde um plano espiritual, e se manifestaram na encarnação como seres sexuados. Esta visão, expressa claramente, era de todo incomum na Idade Média. Homem e mulher estavam assim tão interligados que um era o verdadeiro produto do outro. (sic ad invicem admisti sunt, ut opus alterum per alterum est). Sem a mulher, o homem não poderia ser chamado de homem; sem o homem a mulher não poderia ser chamada de mulher (quia vir sine femina vir non vocaretur, nec femina sine viro femina nominaretur). Homem e mulher obviamente haviam sido criados um para o outro."75
Música e poesia
Ver artigo principal: Canto gregoriano, Modos gregos, Música medieval
Fólio 466 recto do Riesencodex, onde aparece um trecho da Symphonia armonie celestium revelationum.
A técnica da música de Hildegarda se insere em linhas gerais, mas com diferenças importantes, no contexto do canto gregoriano. Não fez uso dos recursos harmônicos e rítmicos que estavam sendo introduzidos pelos proto-polifonistas da Catedral de Notre-Dame de Paris, e sua música, até onde se pôde descobrir, é inteiramente monódica e melódica, embora ela possivelmente estivesse familiarizada com a técnica doorganum76 e o estilo de seu melodismo incorpore elementos da vanguarda musical de sua época e seja ele mesmo inovador em vários aspectos. Os poemas que servem de substrato à música, sempre em latim, são construídos livremente, em versos brancos com metrosdesiguais, e com estruturas estróficas flexíveis, adaptando-se ao conteúdo textual.77 78 Sua música é modal, mas emprega os modos com muita liberdade, e é típico de seu estilo o uso intensivo do mais instável de todos, o frígio. Usa frequentes melismas com finalidades expressivas, alguns de até cinquenta notas sobre palavras particularmente importantes, com um caso de oitenta notas na antífona O vos angeli; trabalha numa tessitura ampla de mais de duas oitavas, em certas peças quase três oitavas, exigindo muito do intérprete e sendo um caso único na música vocal medieval, e sua construção melódica se faz amiúde através de graus disjuntos, sendo muito comum um salto de quintaascendente que é sua marca registrada. Para construir a forma total da composição emprega a variação motívica, com um fragmento melódico reconhecível que aparece várias vezes ao longo da peça em contextos diversos, e usa muitas vezes seções em modos distintos com fins estruturais.16 78 É provável, a partir de algumas alusões de Hildegarda, que ela tenha empregado rotineiramente recursos instrumentais acessórios, capazes de prover algum grau de heterofonia ornamental, mas não sobrevive nenhuma partitura com notação de instrumentos, e restam apenas as linhas vocais.79
A produção de Hildegarda está compreendida em duas obras: o auto sacro Ordo Virtutum (A Ordem das Virtudes) e a Symphonia armonie celestium revelationum (Sinfonia da Harmonia das Revelações Celestes), uma coletânea heterogênea de 77 canções para uso litúrgico ou semi-litúrgico. É importante assinalar que sua produção poética-musical é toda de cunho moralizante e pedagógico, está intimamente ligada aos seus escritos teológicos, e foi-lhe inspirada durante suas inúmeras visões. E mais do que isso, completamente alheia aos dilemas morais de outros compositores sacros de seu tempo, acusados de introduzirem excessiva beleza sensual nas longas e floridas linhas melódicas que se tornavam comuns, e de com isso distraírem perigosamente quem atendia ao serviço divino, Hildegarda via a música como parte quintessencial do ser humano - ele não poderia viver sem ela, pois reunia de forma única alma e corpo e também de certa forma compensava a perda do Éden.80 A música tinha, para Hildegarda, poderes imensos:
"…a música de júbilo suaviza os corações endurecidos, e lhes extrai as lágrimas de compunção, invocando o Espírito Santo… e as canções atravessam (os corações) de modo que eles possam compreender a Palavra perfeitamente; pois a graça divina assim age, banindo toda escuridão, e tornando luminosas todas as coisas que são obscuras para os sentidos corpóreos por causa da fraqueza da carne".81
"Na música se pode ouvir o som da paixão que arde no peito de uma virgem. Podemos ouvir o botão se tornando flor. Podemos ouvir o fulgor da luz espiritual brilhando do céu. Podemos ouvir a profundidade do pensamento dos profetas. Podemos ouvir a sabedoria dos apóstolos se espalhando pelo mundo inteiro. Podemos ouvir o sangue a pingar das chagas dos mártires. Podemos ouvir os mais íntimos movimentos do coração que caminha para a santidade. Podemos ouvir a alegria de uma menina diante da beleza da terra de Deus. Na música a criação devolve para seu Criador seu júbilo e sua exultação; e dá graças por sua própria existência. Também podemos ouvir na música a harmonia entre pessoas que antes eram inimigos e agora são amigos. A música expressa a unidade do mundo como ela era no princípio, a unidade que é restaurada através da penitência e da reconciliação"82
Outros diferenciais são que suas composições foram criadas para serem cantadas por mulheres e a temática do feminino é recorrente no texto; alusões à corporalidade da prática musical e à musicalidade do corpo também são comuns. Disse ela que o cantor é como um instrumento musical de Deus, e que "as palavras simbolizam o corpo, e a música jubilosa revela as atividades do espírito; a harmonia celestial nos mostra Deus, e as palavras, a humanidade do Filho de Deus". Nesse sentido, segundo a análise de Bruce Holsinger, a música vivificava sualiturgia assim como a harmonia celeste vivificava o corpo de Cristo, e sugere que para ela o canto apontava para a imanência da vida espiritual dentro da carne e para a própria Encarnação divina.81 As reiteradas menções ao prazer do canto e ao corpo, particularmente ao corpo feminino, quando Hildegarda teorizou sobre música, a temática do feminino tão presente nos poemas que musicou, e o estilo muitas vezes ricamente ornamental de suas melodias, desviando-se radicalmente da moderação e economia prescritas pela maioria dos teóricos da música sacra do século XII, têm dado margem a uma série de especulações contemporâneas sobre as possíveis ligações de sua concepção musical com as problemáticas dohomoerotismo e da sublimação do desejo no contexto do ambiente monástico, aspectos que têm sido trazidos à evidência por numerosos pesquisadores também quando analisam outros compositores sacros de sua época, como sumarizou Holsinger.83 O que é certo é que a música ocupou um lugar de enorme relevo na vida da comunidade monástica regida por Hildegarda, e todo ofício sacro era decorado com canto. Segundo Barbara Newman era um lugar-comum monástico em seu tempo pensar que o canto agradava a Deus quando era desempenhado com uma mente atenta e um coração devoto, imitando dessa forma os coros angélicos que se dizia estarem perpetuamente louvando a divindade em cantos exaltados, o que seguia uma tradição que remontava à Antiguidade pré-cristã.79
Até pouco tempo atrás sua música permaneceu ignorada pelos historiadores em vista de seu estilo muito distinto das correntes principais da música medieval, mas diversos estudos recentes têm enfatizado a originalidade de sua criação, assim como fizeram seus próprios contemporâneos.84 Suas composições tem ganhado destaque nos programas de música erudita; já há uma discografia significativa e em 1994 o álbum Vision: The Music of Hildegard von Bingen, harmonizando suas melodias vocais com recursos eletrônicos, vendeu 450 mil exemplares e permaneceu por dezesseis semanas no topo da lista Billboard na categoria de música clássica crossover.85
Ordo Virtutum
A Alma humana, iluminura do Scivias.
O auto musicado Ordo Virtutum foi a primeira peça dramática de seu gênero a ser escrita. Deve ter sido composta em torno de 1151, quando ela estava finalizado o Scivias, e de fato uma primeira versão da peça está inclusa no final do livro. É em linhas gerais uma dramatização musicada da luta de uma alma que caiu em pecado em busca de redenção. Os personagens principais são a Alma, o Demônio e as personificações das várias Virtudes que concorrem para o resgate da alma caída, e o texto tem uma clara função moralizante. Cada Virtude tem pelo menos uma seção solo onde descreve suas características. No final a Alma redimida é levada para o céu, enquanto que as Virtudes, lideradas pela Humildade, acorrentam o Demônio.86
A principal fonte documental da obra é o Riesencodex, que traz uma versão contínua, mas em edições modernas o texto foi subdividido em seções. A peça inicia com um Prólogo que apresenta ao público as Virtudes e um coro de Patriarcas e Profetas. Na Cena I um coro de Almas em pranto lamenta as dificuldades da vida na Terra, enquanto que uma delas, a Alma protagonista, celebra, e no final da cena ela acaba desencaminhada pelos argumentos persuasivos do Demônio. A Cena II apresenta em sequência todas as Virtudes, que cantam em solos alternados com passagens em coro. Na Cena III o coro das Almas deplora a perda de uma delas para o mundo, e tentam convencê-la a corrigir seu comportamento. A Cena IV, final, mostra o diálogo entre o Demônio e as Virtudes, que por fim o derrotam e resgatam a Alma. A peça encerra com um coro que sumariza a história do povo de Deus, narrando a Criação, a queda da Natureza e o sofrimento de Cristo.16
Musicalmente a Ordo Virtutum é um exemplo bastante típico do estilo desenvolvido por Hildegarda. Emprega uma larga tessitura vocal, com uma escrita neumática na maior parte do texto, mas com muitas passagens melismáticas, e em vários pontos aparece a sua típica figura de quinta ascendente. A parte do Demônio não é cantada, mas recitada, e devia ser interpretada com rudeza e espalhafato, de acordo com indicações explícitas na partitura, a fim de evidenciar sua carência de harmonia, o que faz um forte contraste com o restante da música. Em muitos momentos há ilustrações musicais do conteúdo do texto, como por exemplo na tessitura instável da parte da Alma, que ilustra seu caráter fraco e suas emoções rebeldes, ou quando passagens em notas agudas indicam sentimentos nobres enquanto que notas graves retratam a aflição ou o desespero. As passagens mais melismáticas aparecem quando as Virtudes descrevem a si mesmas, o que parece querer ilustrar seu caráter sublime e transcendente. De acordo com instruções de Hildegarda os personagens deviam usar figurinos adequados para seu caráter.16
·         Trecho do Ordo Virtutum: O frondens
Symphonia armonie celestium revelationum
Esta coletânea compreende composições em vários gêneros - antífonas, responsórios, sequências, hinos, um Kyrie eleison e um Alleluia - e foi composta a partir de 1150 em peças individuais, mais tarde compiladas juntas. O texto poético dessas pequenas obras é muito próximo da prosa, mas em um estilo artificioso conhecido como Kunstprose (prosa artística). Hildegarda fez um uso muito versátil e criativo do relativamente reduzido vocabulário poético e das formas sintáticas convencionais de que dispunha, e se valeu de justaposições originais de imagens simbólicas que produzem efeitos grandiloquentes e vigorosos, obtendo sonoridades que são musicais independentemente da música. Seus temas geralmente celebram a Encarnação de Cristo, o espelhamento entre humanidade e natureza e a excelsitude das mulheres santas, e o estilo musical do conjunto é em tudo semelhante ao que já foi descrito acima, mas a variedade de soluções formais torna impossível aqui uma análise, mesmo sucinta, das 77 composições individualmente. Não pôde ser determinado com exatidão como essas peças deveriam ser incluídas na liturgia, pois apenas em algumas delas há indicações claras, e a diversas delas é especialmente difícil atribuir um emprego dentro dos ofícios sacros regulares em função de seu estilo muito ornamental; devem, pois, possivelmente ter-se destinado à devoção privada ou para uso em procissões.87 88 A seguir um dos poemas musicados na Symphonia,O viridissima virga:

 fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Hildegarda_de_Bingen#Sua_trilogia_teol.C3.B3gica

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NOSSA SENHORA DA SALETE APARECE A DOIS PASTORZINHOS
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