O SENHOR TE CHAMA


"Gostaria de dizer àqueles e àquelas que se sentem longe de Deus e da Igreja, aos que têm medo ou aos indiferentes:
O Senhor também te chama para seres parte do seu povo, e o faz com grande respeito e amor!" EG, n.113.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

REFLEXÃO SOBRE O CREDO - SÍMBOLO DA FÉ CATÓLICA

Para reflexão em grupo:

Pesquisar sobre o "Credo". Cada grupo lê os textos do Evangelho e reflete sobre os doze artigos. Tente identificar a qual artigo pertence o texto bíblico. Lembrando que são doze artigos.

Grupo 1: Gn 1,1; 1Jo 1,3; Hb 1,2).

Grupo 2: Jo 3,16; Mt 1,18-24.

Grupo 3: Lc 1,26-38.2,6-12; Mt 1,21-23.

Grupo 4: Lc 23,1-7.13-25.33-34.44-46.50.56.

Grupo 5: Lc 24,1-8.

Grupo 6: Mc 6,19; Hb 1,3c.10,12.12,2; 1Pd 3,22; At 7,56; Cl 3,1.

Grupo 7: Mt 16,27; Mt 25,31-46.

Grupo 8: Cl 1,8; 1Ts 4,8; 1Pd 3,15; 1Tes 4,8.

Grupo 9: Col 1,22-26.

Grupo 10: Cl 1,13-14; 1Jo 1,9.

Grupo 11: Lc 24,1-8; 1Ts 4,15-17.

Grupo 12: Mt 25,31-46; 1Jo 1,1-4; 1Tes 4,14-18.

11º e 12º ARTIGOS DO CREDO

11º Artigo do Credo: Na ressurreição da carne.

Quando ocorre a morte, há a separação entre a alma e o corpo, a alma vai para o juízo particular e o corpo para a corrupção. Na Parusia, que é a segunda vinda de Cristo, todos ressuscitarão, ou seja, a alma se unirá novamente, e para sempre, ao corpo que não mais conhecerá a corrupção. Cada um receberá neste dia a sua recompensa segundo sua vida na terra (cf. Ef 3,10-11).

Morrer e Cristo significa morrer na graça de Deus, sem pecado mortal. "Em certo sentido, a morte corporal é natural; mas para a fé ela é na realidade 'salário do pecado' (Rm 6,23). E para os que morrem na graça de Cristo, é uma participação na morte do Senhor, a fim de poder participar também de sua Ressurreição." (CIC § 1006). Com isso, podemos dizer como São Paulo Apóstolo: "Se morrermos com ele, com ele viveremos." (2Tm 2,11).

12º Artigo do Credo: Na Vida Eterna.(Amém)

Por Vida Eterna se entende a vida que terá início logo após a morte e não terá mais fim. Essa vida será eternamente feliz para os bons e eternamente desgraçada para os maus, vivendo os primeiros por toda a eternidade no céu e os demais no inferno por todo o sempre.

No céu goza-se da visão de Deus e da posse de todos os males sem mistura de bem, conforme podemos conferir na passagem bíblica sobre o homem rico e o mendigo Lázaro: "Além de tudo, há entre vós um grande abismo, de maneira que, os que querem passar daqui para vós, não o podem, nem os de lá passar para cá." (Lc 16,26).

O Credo, como também o último livro da Sagrada Escritura, termina com a apalavra hebraica "amen". Em hebraico a palavra "amém" está ligada à mesma raiz da palavra "crer". Esta raiz exprime solidez, confiabilidade e fidelidade. Sendo assim, o "amém" final do Credo retoma e confirma as suas duas primeiras palavras: "Eu CREIO". Crer é dizer "Amém" às palavras, às promessas, aos Mandamentos de Deus, é confiar totalmente naquele que é o "Amém" de infinito amor e de fidelidade perfeita. (CIC § 1061-1064).

OBS: Próxima postagem: Exercícios para REFLEXÃO em grupo.

9º e 10º Artigos do CREDO

9º Artigo do Credo: Na Santa Igreja Católica, na comunhão dos santos.

Cristo "é a cabeça do corpo da Igreja" (Cl 1,18), e nós somos os membros deste corpo. A Igreja é santa porque o próprio Deus é seu autor. Cristo se entregou por ela para santificá-la e torná-la santificante. Na terra a Igreja está ornada de verdadeira santidade, embora imperfeita, pois em seus membros a santidade perfeita ainda é algo a ser adquirido.

A Santa Igreja Católica é uma sociedade visível, vivificada por Cristo, cujos membros perfazem uma comunidade de fé, esperança e caridade. Quem fundou a Igreja foi Jesus Cristo. Todos os homens são chamados a pertencerem à Igreja, porque Jesus o manda, e fora da mesma ninguém pode salvar-se.

Para pertencer à Igreja Católica é necessário ser batizado, professar a doutrina e a lei de Jesus Cristo, participar dos seus Sacramentos, prestar obediência ao Papa e aos Bispos, que são os legítimos pastores da  Igreja. Também tomam parte no ofício de pastores os Presbíteros. O Papa, também chamado de Romano Pontífice, é o vigário de Jesus na terra, é o chefe visível da Igreja.

O Papa é infalível quando, ensinando a toda a Igreja, com autoridade apostólica, define verdades da fé e de costumes. O Papa é infalível, porque tem a promessa de Jesus Cristo, e porque é assistido pelo Espírito Santo.

O Papa é o sucessor de São Pedro, príncipe dos apóstolos. Os Bispos são sucessores dos apóstolos no poder ordinário de governar a Igreja; são pastores fiéis nas dioceses, que lhes são confiadas pelo Papa. O Bispo em sua diocese é o legítimo pastor e superior de todos os fiéis, eclesiásticos e leigos.

Nossas obrigações para com o Papa são: veneração, amor filial, obediência e para com os nossos Bispos são: veneração, amor e honra; devemos prestar-lhe obediência em tudo que se refere à cura das almas e ao governo da diocese.

Jesus Cristo instituiu a Igreja para todos os homens terem nela os meios de salvação. Os principais meios de salvação que temos na Igreja são: a verdadeira fé, a graça dos Sacramentos, a remissão dos pecados e a comunhão dos santos. A comunhão dos santos é a participação dos fiéis nas orações e outras boas obras, que se fazem na Igreja.

10º Artigo do Credo: Na remissão dos pecados.

A Igreja tem a  missão e o poder de perdoar os pecados porque foi o próprio Cristo que lhe conferiu esta autoridade ao dizer: "Recebei o espírito Santo. Aqueles a quem perdoardes os pecados, lhes serão perdoados; aqueles a quem retiverdes, lhes serão retidos." (Jo 20,22-23). A Igreja perdoa os pecados, aplicando os merecimentos de Jesus Cristo, por meio dos Sacramentos.

O perdão dos pecados nos é dado por meio dos sacramentos o Batismo e da Penitência ou Reconciliação. "O Batismo é o primeiro e o principal sacramento do perdão dos pecados, porque nos une a Cristo morto por nossos pecados, ressuscitado para nossa justificação..." (CIC §977).

O perdão que recebemos no batismo é tão pleno e completo que não nos resta mais nada a ser apagado, tanto do pecado original, quanto dos cometidos por livre vontade. Entretanto, a graça deste sacramento não nos livra da fraqueza humana, que constantemente se deixa inclinar ao pecado. Para os pecados cometidos após o Batismo, a remissão vem por meio do sacramento da Reconciliação, o qual deve ser acompanhado de um verdadeiro arrependimento e desejo de não mais tornar e a pecar.

OBS: Próxima postagem: 11º e 12º ARTIGOS DO CREDO, e alguns exercícios para reflexão.


7º e 8º Artigos do CREDO

7º Artigo do Credo: Donde há de vir a julgar os vivos e os mortos.

No fim do mundo, Jesus Cristo descerá visivelmente à terra, para julgar homens de todos os tempos. Neste dia, será revelada a conduta de cada um, e os segredos dos corações, pois "não há nada oculto que não venha descobrir-se, e nada de escondido que não venha ser conhecido" (Lc 12,2). Este julgamento chama-se Juízo Universal ou Final, que será no fim do mundo, e que ninguém sabe quando será. O Senhor manisfestará a todas as criaturas o bem e o mal que fizeram e dará prêmio celeste aos bons e o castigo aos maus.

No dia do juízo final, todos ressuscitarão, ou seja, a alma se unirá novamente ao corpo e irá para o seu destino que será o céu ou inferno. Aqueles que forem para o céu terão um corpo glorioso como o de Jesus após a Sua Ressurreição, conforme afirmação de São Paulo: "Nós, porém, somos cidadãos dos céus. É de lá que ansiosamente esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará nosso mísero corpo, tornando-se semelhante ao seu corpo glorioso, em virtude do poder que tem de sujeitar a si toda criatura (Ef 3,20-21) e os que orem para o inferno padecerão eternamente com alma e corpo.

Antes do juízo Universal há o juízo particular de cada um, logo depois da morte. Depois deste, o juízo Particular, a alma irá para o Céu, ou para o inferno, ou para o Purgatório.

A alma que vai para o céu, logo depois do juízo particular, é a alma que está livre de todo o pecado e não há pena alguma que descontar.

A alma que vai para o inferno, logo depois do juízo particular, é a alma que está em pecado mortal.

A alma que vai para o purgatório, logo depois do juízo particular, é a alma que tem ainda algum pecado venial ou alguma pena que descontar.

Purgatório é o lugar onde as almas dos justos se purificam, satisfazem com penas temporais o que ficaram devendo por seus pecados. Podemos diminuir o tempo de nossa alma no purgatório com jejum, penitência e oração. Podemos abreviar a duração das penas das almas de nossos irmãos no purgatório com orações, boas obras, indulgências e principalmente com o santo sacrifício da Missa.

8º Artigo do Credo: Creio no Espírito Santo.

Crer no espírito Santo é professar a terceira pessoa da Santíssima Trindade, que procede do Pai e do Filho, e é adorado e glorificado com o Pai e o Filho. O Espírito foi "enviado aos nossos corações". (Gl 4,6). A ele se atribui especialmente a santificação das almas. "Ninguém pode dizer que Jesus é o Senhor a não ser no Espírito Santo." (1Cor 12,3).

O Espírito Santo sempre esteve presente em toda a história."Ao Espírito Santo cabe, reinar, santificar e animar a criação, pois é Deus consubstancial ao Pai e ao Filho... A Ele cabe o poder sobre a vida, pois sendo Deus, ele conserva a criação no Pai pelo Filho" (CIC § 703). Ele é o Consolador, o Santificador, é Ele que nos santifica e nos dá a graça para cada vez mais estarmos próximos de Jesus.

Costuma-se figurar o Espírito Santo em forma de pomba, porque foi assim que o Espírito Santo se mostrou no Batismo de Jesus Cristo. O Espírito Santo mostrou-se outras vezes de modo visível aos homens principalmente no dia de Pentecostes, em línguas de fogo descendo sobre Nossa Senhora e os apóstolos. O efeito que o Espírito Santo produziu nos apóstolos foi enchê-los de luz, de força e de todos os seus dons, para anunciarem o Evangelho e propagarem a Igreja de Jesus Cristo.

OBS: Próxima postagem: 9º e 10º Artigos do CREDO.


4º, 5º e 6º Artigos do Credo - Crucifixão, Morte, Ressurreição e Ascenção de Jesus

4º Artigo Credo: Padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado morto e sepultado.

Jesus Cristo padeceu, foi crucificado, morto e sepultado para nos salvar. Jesus Cristo padeceu tristeza, dores e suplício da cruz. Ele morreu pregado na cruz e, através de seu sacrifício, reconduziu o homem à comunhão com Deus, reconciliou-nos com Ele pelo "sangue derramado por muitos para remissão dos pecados" (Mt 26,28). Santa Rosa de Lima nos ensina que fora da Cruz não existe outra escada por onde subir ao céu.

Jesus Cristo morreu na Sexta-feira Santa às três horas da tarde e o estado de Cristo morto é o mistério do sepulcro e da descida à mansão dos mortos. "É o mistério do Sábado Santo, em que Cristo depositado no túmulo manifesta o grande descanso sabático de Deus depois da realização da salvação dos homens, que confere paz ao universo inteiro". (CIC §624).

Jesus Cristo padeceu e morreu enquanto homem, porque enquanto Deus não podia padecer nem morrer. O Mistério da Paixão e Morte de Jesus Cristo chama-se REDENÇÃO. Depois da morte de Jesus Cristo, seu corpo foi sepultado.

5º Artigo do Credo: Desceu à mansão dos mortos; ressuscitou ao terceiro dia.

Desceu à mansão dos mortos quer dizer que, depois da morte de Jesus Cristo, sua alma desceu a "morada dos mortos". O limbo ao qual desceu Jesus Cristo, quer dizer o lugar onde estavam todas as almas, tanto dos justos quanto dos injustos.

Jesus conheceu a morte como todos os seres humanos e com sua alma esteve com eles. Entretanto, foi para lá como Salvador, proclamando a boa notícia aos espíritos que ali estavam aprisionados. Os que lá se encontravam estavam privados da visão de Deus e apesar de todas as almas estarem no mesmo lugar, não significa dizer que teriam o mesmo destino; aos justos erra destinada a redenção. "Jesus não desceu aos infernos para ali libertar os condenados nem para destruir o inferno da condenação, mas para libertar os justos que o haviam precedido". (CIC §633).

Jesus Cristo ressuscitou depois de estar morto três dias incompletos, a saber: parte da sexta-feira, todo o sábado e parte do domingo.

A ressurreição de Jesus não é simplesmente um retornar a vida terrestre, como foi com Lázaro (cf. Jo 11,11-45). A ressurreição de Cristo é essencialmente diferente, em seu corpo ressuscitado, com propriedade de um corpo glorioso, não está mais situado no espaço e no tempo, pois sua humanidade não está mais presa à terra, mas pertence única e exclusivamente ao domínio divino do Pai.

A Ressurreição de Jesus é a verdade culminante de nossa fé em Cristo, pregada juntamente com a cruz, como parte essencial do Mistério Pascal. Jesus Cristo ressuscitou na madrugada do dia da Páscoa. Páscoa quer dizer: passagem da morte para a vida que não acaba mais.

6º Artigo do Credo: Subiu aos Céus, está sentado à direita de Deus Pai Todo-Poderoso.

O corpo de Jesus foi glorioso desde que ressuscitou. Depois de sua ressurreição, Jesus Cristo esteve na terra quarenta dias, para confirmar seus discípulos na fé, instruindo-os sobre o Reino, estando sua glória velada sobre os traços de uma humanidade comum.

A sua última aparição se deu pela entrada irreversível de sua humanidade na glória divina simbolizada pela nuvem e pelo céu (At 1,9; Lc 24,51). A este "Mistério" damos o nome de ASCENÇÃO, pois Jesus subiu aos céus por si mesmo, pelo seu próprio poder, depois dos quarenta dias.

Jesus está sentado à direita do Pai (cf. Mc 16,19). "Por direita do Pai entendemos a glória e a honra da divindade, onde aquele que existia como Filho de Deus antes de todos os séculos como Deus e consubstancial ao Pai se sentou corporalmente depois de encarnar-se e de sua carne ser glorificada" (CIC §663). Jesus Cristo no céu tem lugar de honra, como Deus, sobre todas as criaturas. Com isso, inaugura-se o Reino do Messias.

OBS: Na próxima postagem os 7º e 8º Artigos do Credo.


sábado, 8 de dezembro de 2012

Com a Imaculada Conceição Nossa Senhora participa na santidade e na graça da Igreja


Um privilégio 
que a torna mais humana

A Imaculada Conceição da Virgem não é mérito, mas «arbítrio» e favor divino, não é exigência e necessidade, mas «fantasia» e liberdade do Espírito Santo. Compreende-se este carisma de Maria na sucessão da criação do homem, que Deus decide idealizar a partir do seu Filho, da humanidade do Verbo feito homem. Por conseguinte, o «privilégio» da Imaculada Conceição, concedido em virtude dos méritos da cruz e já à imagem da Ressurreição, não afasta Maria da humanidade, mas torna-a agora mais próxima e mais ativamente vizinha: da sua existência, e antes de tudo da sua fé, passa o Filho de Deus salvador. Não a graça, mas o pecado torna hostis ao homem. 

Contudo, nos nossos dias, observa Michele Giulio Masciarelli, há uma espécie «de “dogma” laico, de proveniência iluminista, segundo o qual o homem só responde daquilo que faz intencionalmente. Este dogma laico é obedecido universalmente não obstante seja desmentido pelo fato da vida: com efeito, é também verdade que a existência do homem não passa só pela sua atenta previdência, pela sua Projetação precavida e talvez astuta: morte, doença, desgraças, inversões imprevistas, que se apresentam devastadoras e irreparáveis, são disto a confirmação incontestável. O cristianismo, com o mistério da Imaculada, contesta este dogma laico recordando a todos que não começamos por nós, nem como queremos, mas começamos pela vontade de outros, nascemos sem escolher nem de quem nem lugares e outras modalidades da existência. Maria, com este seu mistério, recorda não só aos cristãos, mas a todos que a vida do homem não passa sempre e só pelo seu livre assentimento: não foram pedidos a Maria nem o seu assentimento nem a colaboração para o seu nascimento imaculado».

Portanto, existe uma primazia da ação que não pode ser nem ignorada nem desencrementada, porque brota e remete para o desígnio providencial de Deus que tem a finalidade de libertar cada pessoa dos atilhos duros do individualismo egocêntrico incapaz de fazer seu o bem genuíno e inapto para captar o Outro e n'Ele os outros. O segredo da interioridade imensa de Maria é fazer a vontade de Deus.

Segundo o juízo humano, quem poderia crer que da mais perfeita de todas as criaturas humanas nos fosse contado tão pouco nas Escrituras? «Nenhuma obra por ela empreendida – escreve Antonio Rosmini – uma vida que o mundo cego classificaria de contínua falta de ação, e que Deus demonstrou que é a mais sublime, a mais virtuosa, a mais generosa de todas as vidas». «Assim fez muito mais Maria Santíssima, da qual se conhecem tão poucas ações, do que São Paulo com tantas fadigas e pregações». «Sendo a mais santa das criaturas puras – prossegue Rosmini – ela torna-se como o fim do mundo, depois de Cristo, e o fim da obra é aquilo que primeiro é concebido na mente do artífice». 
L’OSSERVATORE ROMANO
08.12.2012.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Deus é uma realidade da nossa vida, é tão grande que tem tempo também para nós, preocupa-se conosco.


Como falar de Deus?

Queridos irmãos e irmãs,

A interrogação central que hoje levantamos é a seguinte: como falar de Deus no nosso tempo?
Como comunicar o Evangelho, para abrir caminhos à sua verdade salvífica nos corações muitas vezes fechados dos nossos contemporâneos e nas suas mentes por vezes distraídas pelas numerosas luzes da sociedade? 

O próprio Jesus, dizem-nos os evangelistas, ao anunciar o Reino de Deus, interrogou-se acerca disto: «A quem compararemos o Reino de Deus? Ou com que parábola o representaremos?» (Mc 4, 30). 

Como falar de Deus hoje? A primeira resposta é que nós podemos falar de Deus, porque Ele falou conosco. Portanto, a primeira condição para falar de Deus é a escuta daquilo que o próprio Deus disse. Deus falou connosco! Por conseguinte, Deus não é uma hipótese distante sobre a origem do mundo; não é uma inteligência matemática muito distante de nós. Deus interessa-se por nós, ama-nos, entrou pessoalmente na realidade da nossa história e comunicou-se a si mesmo a ponto de se encarnar. 

Portanto, Deus é uma realidade da nossa vida, é tão grande que tem tempo também para nós, preocupa-se conosco. Em Jesus de Nazaré nós encontramos o rosto de Deus, que desceu do seu Céu para se imergir no mundo dos homens, no nosso mundo, e para ensinar a «arte de viver», o caminho da felicidade; para nos libertar do pecado e para nos tornar filhos de Deus (cf. Ef 1, 5; Rm 8, 14). Jesus veio para nos salvar e para nos mostrar a vida boa do Evangelho.

Falar de Deus quer dizer, antes de tudo, ter bem claro o que devemos levar aos homens e às mulheres do nosso tempo: não um Deus abstrato, uma hipótese, mas um Deus concreto, um Deus que existe, que entrou na história e está presente na história; o Deus de Jesus Cristo como resposta à pergunta fundamental do porquê e do como viver. 

Por isso, falar de Deus exige uma familiaridade com Jesus e com o seu Evangelho, supõe um nosso conhecimento pessoal e real de Deus, e uma forte paixão pelo seu desígnio de salvação, sem ceder à tentação do sucesso, mas seguindo o método do próprio Deus. O método de Deus é o da humildade — Deus faz-se um de nós — é o método realizado na Encarnação na simples casa de Nazaré e na gruta de Belém, o da parábola do pequeno grão de mostarda. É preciso não temer a humildade dos pequenos passos e confiar no fermento que se mistura com a massa e que, lentamente, a faz crescer (cf. Mt 13, 33).

Ao falar de Deus, na obra de evangelização, sob a guia do Espírito Santo, é necessária uma recuperação de simplicidade, um retorno ao essencial do anúncio: a Boa Notícia de um Deus que é real e concreto, um Deus que se interessa por nós, um Deus-Amor que se faz próximo de nós em Jesus Cristo até à Cruz, e que na Ressurreição nos doa a esperança e nos abre para uma vida que não tem fim, a vida eterna, a vida verdadeira. 

Aquele comunicador extraordinário que foi o apóstolo Paulo oferece-nos uma lição que vai precisamente ao cerne da fé, do problema de «como falar de Deus» com grande simplicidade. 

Na Primeira Carta aos Coríntios, ele escreve: «Também eu, quando fui ter convosco, irmãos, não fui com o prestígio da eloquência nem da sabedoria, anunciar-vos o testemunho de Deus. Julguei não dever saber coisa alguma entre vós, senão Jesus Cristo, e Jesus Cristo crucificado» (2, 1-2). 

Portanto, a primeira realidade é que Paulo não fala de uma filosofia por ele desenvolvida, não fala de ideias que encontrou alhures ou que inventou, mas fala de uma realidade da sua vida, fala do Deus que entrou na sua vida, fala de um Deus real que vive, falou com Ele e falará connosco, fala do Cristo crucificado e ressuscitado. 

A segunda realidade é que Paulo não se procura a si mesmo, não quer criar para si um grupo de admiradores, não quer entrar na história como chefe de uma escola de grandes conhecimentos, não se procura a si mesmo, mas são Paulo anuncia Cristo e deseja conquistar as pessoas para o Deus verdadeiro e real. Paulo fala só com o desejo de anunciar aquilo que entrou na sua vida, e que é a vida autêntica, que o arrebatou no caminho de Damasco. 

Portanto, falar de Deus quer dizer reservar espaço Àquele que no-lo faz conhecer, que nos revela o seu rosto de amor; quer dizer expropriar o próprio eu, oferecendo-o a Cristo, na consciência de que não somos nós que podemos conquistar os outros para Deus, mas devemos esperá-los do próprio Deus, invocá-los dele. Portanto, falar de Deus nascer da escuta, do nosso conhecimento de Deus que se realiza na familiaridade com Ele, na vida da oração e segundo os Mandamentos.

Comunicar a fé, para são Paulo, não significa anunciar-se a si mesmo, mas dizer aberta e publicamente aquilo que viu e sentiu no encontro com Cristo, quanto experimentou na sua existência já transformada por aquele encontro: é anunciar aquele Jesus que sente presente em si e que se tornou a verdadeira orientação da sua vida, para levar todos a compreender que Ele é necessário para o mundo e é decisivo para a liberdade de cada homem. 

O apóstolo não se contenta com proclamar palavras, mas envolve toda a sua existência na grande obra da fé. Para falar de Deus, é necessário reservar-lhe espaço, na confiança de que é Ele quem age na nossa debilidade: reservar-lhe espaço sem medo, com simplicidade e alegria, na convicção profunda de que quanto mais O pusermos no centro, Ele e não nós, tanto mais a nossa comunicação será frutuosa. E isto é válido também para as comunidades cristãs: elas são chamadas a mostrar a ação transformadora da graça de Deus, superando individualismos, fechamentos, egoísmos, indiferenças e vivendo o amor Deus nos relacionamentos quotidianos. Perguntemo-nos se as nossas comunidades são verdadeiramente assim. Temos que agir, para nos tornarmos sempre e realmente assim, anunciadores de Cristo e não de nós mesmos.

Nesta altura, temos que nos interrogar como o próprio Jesus comunicava. Na sua unicidade, Jesus fala do seu Pai — Abbá — e do Reino de Deus, com o olhar cheio de compaixão pelas necessidades e dificuldades da existência humana. Fala com grande realismo e, diria, o essencial do anúncio de Jesus é que torna transparente o mundo e a nossa vida tem valor para Deus. Jesus demonstra que no mundo e na criação transparece o rosto de Deus e mostra-nos que Deus está presente nas histórias quotidianas da nossa vida. 

Quer nas parábolas da natureza, o grão de mostarda, o campo com diversas sementes, quer na nossa vida, pensamos na parábola do filho pródigo, de Lázaro e noutras parábolas de Jesus. Dos Evangelhos nós vemos como Jesus se interessa por cada situação humana que Ele encontra, se imerge na realidade dos homens e das mulheres do seu tempo, com uma confiança plena na ajuda do Pai. E que realmente nesta história, de modo escondido, Deus está presente e, se prestarmos atenção, podemos encontrá-lo. 

E os discípulos que vivem com Jesus, as multidões que O encontram, vêem a sua reação aos problemas mais diversos, vêem como Ele fala, como se comporta; vêem nele a obra do Espírito Santo, a ação de Deus. Nele anúncio e vida entrelaçam-se: Jesus age e ensina, começando sempre a partir de uma relação íntima com Deus Pai. 

Este estilo torna-se uma indicação essencial para nós, cristãos: o nosso modo de viver na fé e na caridade torna-se um falar de Deus no presente, porque mostra com uma existência vivida em Cristo a credibilidade, o realismo daquilo que dizemos com palavras, que não são apenas palavras, mas demonstram a realidade, a realidade verdadeira. E nisto devemos estar atentos a captar os sinais dos tempos na nossa época, ou seja, a identificar as potencialidades, os desejos, os obstáculos que se encontram na cultura atual, de modo particular o desejo de autenticidade, o anseio pela transcendência, a sensibilidade pela salvaguarda da criação, e comunicar sem temor a resposta oferecida pela fé em Deus. O Ano da fé é ocasião para descobrir, com a fantasia animada pelo Espírito Santo, novos percursos a níveis pessoal e comunitário, a fim de que em cada lugar a força do Evangelho seja sabedoria de vida e orientação da existência.

Também no nosso tempo, um lugar privilegiado para falar de Deus é a família, a primeira escola para comunicar a fé às novas gerações. O Concílio Vaticano II fala dos pais como dos primeiros mensageiros de Deus (cf. Constituição dogmática Lumen gentium, 11; Decreto Apostolicam actuositatem, 11), chamados a redescobrir esta sua missão, assumindo a responsabilidade de educar, de abrir as consciências dos pequeninos ao amor de Deus, como um serviço fundamental à sua vida, de ser os primeiros catequistas e mestres da fé para os seus filhos. 

E nesta tarefa é importante antes de tudo a vigilância, que significa saber aproveitar as ocasiões favoráveis para introduzir na família o discurso de fé e para fazer amadurecer uma reflexão crítica em relação aos numerosos condicionamentos aos quais os filhos estão submetidos. Esta atenção dos pais é também sensibilidade de entender as possíveis interrogações religiosas presentes no espírito dos filhos, às vezes evidentes, outras, escondidas. 

Depois, a alegria: a comunicação da fé deve ter sempre uma tonalidade de alegria. É a alegria pascal, que não se cala, nem oculta a realidade da dor, do sofrimento, do cansaço, da dificuldade, da incompreensão e da própria morte, mas sabe oferecer os critérios para interpretar tudo na perspectiva da esperança cristã. A vida boa do Evangelho é precisamente este novo olhar, esta capacidade de ver cada situação com os olhos do próprio Deus. 

É importante ajudar todos os membros da família a compreender que a fé não é um peso, mas uma fonte de júbilo profundo, é entender a obra de Deus, reconhecer a presença do bem, que não faz ruído; e oferece orientações preciosas para viver bem a própria existência. Enfim, a capacidade de escuta e de diálogo: a família deve ser um ambiente em que as pessoas aprendem a estar juntas, a recompor os contrastes no diálogo recíproco, que é feito de escuta e de palavra, a compreender-se e a amar-se, para ser um sinal mútuo do amor misericordioso de Deus.

Portanto, falar de Deus quer dizer fazer compreender com a palavra e com a vida que Deus não é o concorrente da nossa existência, mas sobretudo o seu verdadeiro garante, o protetor da grandeza da pessoa humana. 

Assim voltamos ao início: falar de Deus é comunicar, com força e simplicidade, com a palavra e a vida, aquilo que é essencial: o Deus de Jesus Cristo, aquele Deus que nos mostrou um amor tão grande, a ponto de se encarnar, morrer e ressuscitar por nós; aquele Deus que pede para O seguir e para se deixar transformar pelo seu amor imenso, para renovar a nossa vida e os nossos relacionamentos; aquele Deus que nos concedeu a Igreja, para caminharmos juntos e, através da Palavra e dos Sacramentos, renovarmos toda a Cidade dos homens, a fim de que ela possa tornar-se Cidade de Deus.



Papa Bento XVI.

Hoje, nesta catequese, gostaria de meditar sobre o bom senso da fé em Deus. (Papa Bento XVI)

O bom senso da fé em Deus 

Estimados irmãos e irmãs

Caminhemos em frente neste Ano da fé, levando no nosso coração a esperança de redescobrir quanta alegria existe em crer e em reencontrar o entusiasmo de comunicar a todos as verdades da fé. Estas verdades não constituem uma simples mensagem acerca de Deus, uma informação particular sobre Ele. Ao contrário, exprimem o acontecimento do encontro de Deus com os homens, encontro salvífico e libertador, que realiza as aspirações mais profundas do homem, os seus anseios de paz, de fraternidade e de amor. 

A fé leva a descobrir que o encontro com Deus valoriza, aperfeiçoa e eleva aquilo que existe de verdadeiro, de bom e de belo no homem. Assim acontece que, enquanto Deus se revela e se deixa conhecer, o homem descobre quem é Deus e, conhecendo-o, descobre-se a si mesmo, a própria origem, o seu destino, a grandeza e a dignidade da vida humana.

A fé permite um saber autêntico sobre Deus, que abrange toda a pessoa humana: é um “saber”, ou seja de um conhecer que confere sabor à vida, um novo gosto de existir, um modo jubiloso de estar no mundo. A fé manifesta-se no dom de si pelos outros, na fraternidade que torna o homem solidário, capaz de amar, vencendo a solidão que o torna triste. Por isso, este conhecimento de Deus através da fé não é unicamente intelectual, mas vital. 

É o conhecimento de Deus-Amor, graças ao seu próprio amor. Além disso, o amor de Deus faz ver, abre os olhos, permite conhecer toda a realidade, para além das perspectivas limitadas do individualismo e do subjetivismo que desorientam as consciências. Por isso, o conhecimento de Deus é experiência de fé e implica, ao mesmo tempo, um caminho intelectual e moral: tocados profundamente pela presença do Espírito de Jesus em nós, ultrapassamos os horizontes dos nossos egoísmos e abrimo-nos aos verdadeiros valores da existência.

Hoje, nesta catequese, gostaria de meditar sobre o bom senso da fé em Deus. Desde os primórdios, a tradição católica rejeitou o chamado fideísmo, que é a vontade de crer contra a razão. Credo quia absurdum (creio, porque é absurdo) não é uma fórmula que interpreta a fé católica. Com efeito, Deus não é absurdo, eventualmente é mistério. 

O mistério por sua vez não é irracional, mas superabundância de sentido, de significado, de verdade. Se, olhando para o mistério, a razão vê obscuridade, não é porque no mistério não haja luz, mas sobretudo porque há demasiada. Assim como quando o olhar do homem se volta diretamente para o sol, só vê trevas; mas quem diria que o sol não é luminoso, aliás, a fonte da luz? A fé permite olhar para o «sol», Deus, porque é acolhimento da sua revelação na história e, por assim dizer, recebe verdadeiramente toda a luminosidade do mistério de Deus, reconhecendo o grande milagre: Deus aproximou-se do homem, ofereceu-se ao seu conhecimento, condescendendo com o limite criatural da sua razão (cf. Concílio Ecumênico Vaticano II, Constituição dogmática Dei Verbum, 13). 

Ao mesmo tempo Deus, com a sua graça, ilumina a razão, abre-lhe horizontes novos, incomensuráveis e infinitos. Por isso, a fé constitui um estímulo a procurar sempre, a nunca parar nem se contentar com a descoberta inesgotável da verdade e da realidade. É falso o preconceito de certos pensadores modernos, segundo os quais a razão humana seria como que bloqueada pelos dogmas da fé. É verdade precisamente o contrário, como os grandes mestres da tradição católica demonstraram. 

Antes da sua conversão, santo Agostinho procura a verdade com grande inquietação, através de todas as filosofias disponíveis, julgando-as todas insatisfatórias. A cansativa busca racional é para ele uma pedagogia significativa para o encontro com a Verdade de Cristo. Quando diz: «compreende para crer, e crê para compreender» (Discurso 43, 9: PL 38, 258), é como se narrasse a própria experiência de vida. Diante da Revelação divina, intelecto e fé não são alheios nem antagonistas, mas ambos são condições para compreender o sentido da mesma, para acolher a sua mensagem autêntica, aproximando-se do limiar do mistério. Juntamente com muitos outros autores cristãos, santo Agostinho é testemunha de uma fé que se exerce com a razão, que pensa e convida a pensar. 

Neste sulco, santo Anselmo dirá no seu Proslogion que a fé católica éfides quaerens intellectum, onde o procurar a inteligência é um ato interior do crer. Será principalmente são Tomás de Aquino — fortalecido por esta tradição — que se confrontará com a razão dos filósofos, mostrando quanta vitalidade racional nova e fecunda deriva para o pensamento humano da inserção dos princípios e das verdades da fé cristã.

Portanto, a fé católica é razoável e nutre confiança também na razão humana. Na Constituição dogmática Dei Filius, o Concílio Vaticano I afirmou que a razão é capaz de conhecer com certeza a existência de Deus através do caminho da criação, enquanto à fé pertence só a possibilidade de conhecer «facilmente, com certeza absoluta e sem erro» (ds 3005) as verdades que dizem respeito a Deus, à luz da graça. Além disso, o conhecimento da fé não é contrário à recta razão. Com efeito, na Encíclica Fides et ratio, o Beato Papa João Paulo II resume assim: «A razão do homem não é anulada nem humilhada, quando presta assentimento aos conteúdos de fé; é que estes são alcançados por decisão livre e consciente» (n. 43). No desejo irresistível de verdade, somente uma relação harmoniosa entre fé e razão é o caminho recto que conduz a Deus e ao pleno cumprimento de si mesmo.

Esta doutrina é facilmente reconhecível em todo o Novo Testamento. Como ouvimos, escrevendo aos cristãos de Corinto, são Paulo afirma: «Os judeus pedem milagres, os gregos reclamam a sabedoria; mas nós pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os pagãos» (1 Cor 1, 22-23). Com efeito, Deus salvou o mundo não com um gesto de poder, mas mediante a humilhação do seu Filho unigênito: segundo os parâmetros humanos, a modalidade insólita atuada por Deus não condiz com as exigências da sabedoria grega. E no entanto, a Cruz de Cristo tem uma sua razão, que são Paulo chama: ho lógos tou staurou, “a palavra da cruz” (1 Cor 1, 18). 

Aqui, o termo lógos indica tanto a palavra como a razão e, se alude à palavra, é porque expressa verbalmente o que a razão elabora. Portanto, Paulo vê na Cruz não um acontecimento irracional, mas um acontecimento salvífico que possui um seu bom senso reconhecível à luz da fé. Ao mesmo tempo, ele tem tanta confiança na razão humana, a ponto de se admirar pelo facto de que muitos, mesmo vendo as obras realizadas por Deus, se obstinam a não acreditar n’Ele. 

Na Carta aos Romanos diz: «Com efeito, as... perfeições invisíveis [de Deus], o seu poder e divindade sempiternos, tornam-se visíveis à inteligência, através das suas obras» (1, 20). Assim, também são Pedro exorta os cristãos da diáspora a adorar «Cristo Senhor nos vossos corações. Estai sempre prontos a responder, para a vossa defesa, a todo aquele que vos perguntar a razão da vossa esperança» (1 Pd 3, 15). Num clima de perseguição e de forte exigência de testemunhar a fé, aos fiéis pede-se que justifiquem com motivações fundadas a sua adesão à palavra do Evangelho, que expliquemos a razão da nossa esperança.

É nestas premissas acerca do nexo fecundo entre compreender e crer que se funda inclusive a relação virtuosa entre ciência e fé. Como vemos, a pesquisa científica leva ao conhecimento de verdades sempre novas sobre o homem e o cosmos. O verdadeiro bem da humanidade, acessível na fé, abre o horizonte no qual se deve mover o seu caminho de descoberta. Portanto devem ser encorajadas, por exemplo, as investigações postas ao serviço da vida, que visam debelar as enfermidades. 

São importantes também as pesquisas destinadas a descobrir os segredos do nosso planeta e do universo, na consciência de que o homem está no ápice da criação não para a explorar insensatamente, mas para a preservar e tornar habitável. Assim a fé, vivida realmente, não entra em conflito com a ciência, aliás, coopera com ela, oferecendo critérios basilares a fim de que promova o bem de todos, pedindo-lhe que renuncie apenas àquelas tentativas que — opondo-se ao desígnio originário de Deus — podem produzir efeitos que se voltam contra o próprio homem. 

Também por isso é razoável acreditar: se a ciência é uma aliada preciosa da fé para a compreensão do desígnio de Deus no universo, a fé permite que o progresso científico se realize sempre para o bem e para a verdade do homem, permanecendo fiel a este mesmo desígnio.

Eis por que motivo é decisivo para o homem abrir-se à fé e conhecer Deus e o seu desígnio de salvação em Jesus Cristo. No Evangelho é inaugurado um novo humanismo, uma autêntica «gramática» do homem e de toda a realidade. O Catecismo da Igreja Católica afirma: «A verdade de Deus é a sua sabedoria, que comanda toda a ordem da criação e governo do mundo. Só Deus que, sozinho, “criou o céu e a terra” (Sl 115, 15), pode dar o conhecimento verdadeiro de todas as coisas criadas na sua relação com Ele» (n. 216).

Então, confiamos que o nosso compromisso na evangelização ajuda a dar uma renovada centralidade ao Evangelho na vida de muitos homens e mulheres do nosso tempo. E oremos a fim de que todos voltem a encontrar em Cristo o sentido da existência e o fundamento da verdadeira liberdade: com efeito, sem Deus o homem perde-se a si próprio. Os testemunhos de quantos nos precederam e dedicaram a sua vida ao Evangelho confirmam-no para sempre. Crer é razoável, está em jogo a nossa existência. Vale a pena despender-se por Cristo, o único que sacia os desejos de verdade e de bem arraigados na alma de cada homem: agora, no tempo que passa, e no dia sem ocaso da Eternidade bem-aventurada.


Papa Bento XVI

Deus não se cansa de nos procurar, é fiel ao homem que criou e salvou, permanece próximo da nossa vida, porque nos ama.


Os caminhos para chegar ao conhecimento de Deus

Queridos irmãos e irmãs!

Refletimos sobre o desejo de Deus que o ser humano leva no profundo de si mesmo. Hoje gostaria de continuar a aprofundar este aspecto, meditando brevemente convosco sobre alguns caminhos para chegar ao conhecimento de Deus. Contudo, gostaria de recordar que a iniciativa de Deus precede sempre todas as iniciativas do homem e, também no caminho rumo a Ele, é Ele em primeiro lugar quem nos ilumina, orienta e guia, respeitando sempre a nossa liberdade. E é sempre Ele quem nos faz entrar na sua intimidade, revelando-se e doando-nos a graça para poder acolher esta revelação na fé. Nunca esqueçamos a experiência de santo Agostinho: não somos nós que possuímos a Verdade depois de a termos procurado, mas é a Verdade que nos procura e nos possui.

Todavia, há caminhos que podem abrir o coração do homem ao conhecimento de Deus, sinais que conduzem para Deus. Certamente, com frequência corremos o risco de sermos ofuscados pelo cintilar da vida mundana, que nos torna menos capazes de percorrer tais caminhos ou de ler tais sinais. Contudo, Deus não se cansa de nos procurar, é fiel ao homem que criou e salvou, permanece próximo da nossa vida, porque nos ama. 

Esta é uma certeza que nos deve acompanhar todos os dias, mesmo se determinadas mentalidades difundidas dificultam que a Igreja e o cristão comuniquem a alegria do Evangelho a cada criatura e levem todos ao encontro com Jesus, único Salvador do mundo. Todavia, esta é a nossa missão, é a missão da Igreja e todos os crentes devem vivê-la jubilosamente, sentindo-a como própria, através de uma existência animada verdadeiramente pela fé, marcada pela caridade, pelo serviço a Deus e aos outros, e capaz de irradiar esperança. Esta missão resplandece sobretudo na santidade para a qual todos somos chamados.

Hoje — sabemo-lo — não faltam dificuldades e provações para a fé, frequentemente pouco compreendida, contestada e rejeitada. São Pedro dizia aos seus cristãos: «Estai sempre prontos a responder, para a vossa defesa, com doçura e respeito, a todo aquele que vos perguntar a razão da vossa esperança» (1 Pd 3, 15). 

No passado, no Ocidente, numa sociedade considerada cristã, a fé era o âmbito no qual ela se movia; a referência e a adesão a Deus eram, para a maioria das pessoas, parte da vida quotidiana. Ao contrário, era quem não acreditava que devia justificar a própria incredulidade. No nosso mundo a situação mudou e cada vez mais o crente deve ser capaz de dizer a razão da sua fé. 

O beato João Paulo II, na Encíclica Fides et ratio, realçava o modo como a fé é posta à prova também na época contemporânea, atravessada por formas sutis e capciosas de ateísmo teórico e prático (cf. nn. 46-47).

A partir do Iluminismo, a crítica à religião intensificou-se; a história foi marcada também pela presença de sistemas ateus, nos quais Deus era considerado uma mera projeção do ânimo humano, uma ilusão e o produto de uma sociedade já alterada por tantas alienações. 
Depois, o século passado conheceu um forte processo de secularismo, sob a bandeira da autonomia absoluta do homem, considerado como medida e artífice da realidade, mas empobrecido do seu ser criatura «à imagem e semelhança de Deus». 

No nosso tempo verificou-se um fenômeno particularmente perigoso para a fé: de facto, existe uma forma de ateísmo que definimos «prático», no qual não se negam as verdades da fé ou os ritos religiosos, mas simplesmente se consideram irrelevantes para a existência quotidiana, destacadas da vida, inúteis. Então, com frequência, cremos em Deus de modo superficial, e vivemos «como se Deus não existisse» (etsi Deus non daretur). Mas, no final este modo de viver resulta ainda mais destrutivo, porque leva à indiferença à fé e à questão de Deus.

Na realidade, o homem separado de Deus reduz-se a uma só dimensão, a horizontal, e precisamente este reducionismo é uma das causas fundamentais dos totalitarismos que tiveram consequências trágicas no século passado, assim como a crise de valores que vemos na realidade atual. 

Obscurecendo a referência a Deus obscureceu-se também o horizonte ético, abrindo espaço ao relativismo e confirmando-se uma concepção ambígua da liberdade que em vez de ser liberatória acaba por ligar o homem a ídolos. As tentações que Jesus enfrentou no deserto antes da sua missão pública, representam bem aqueles «ídolos» que fascinam o homem, quando não vai além de si mesmo. Se Deus perder a centralidade, o homem perde o seu justo lugar, e não encontra a sua colocação na criação, nas relações com os outros. Não se extinguiu o que a sabedoria antiga evoca com o mito de Prometeu: o homem pensa que pode tornar-se ele mesmo «deus», dono da vida e da morte.

Diante deste quadro, a Igreja, fiel ao mandato de Cristo, nunca cessa de afirmar a verdade sobre o homem e sobre o seu destino. O Concílio Vaticano II afirma sinteticamente que: «O aspecto mais sublime da dignidade humana encontra-se na vocação do homem à união com Deus. Começa com a existência o convite que Deus dirige ao homem para dialogar com Ele: se o homem existe é porque Deus o criou por amor e, por amor, não cessa de o conservar na existência; e o homem não vive plenamente segundo a verdade, se não reconhecer livremente este amor e não se entregar inteiramente ao seu criador» (Const. Gaudium et spes, 19).

Então, que respostas está a fé chamada a dar, com «doçura e respeito», ao ateísmo, ao cepticismo, à indiferença pela dimensão vertical, para que o homem do nosso tempo possa continuar a interrogar-se sobre a existência de Deus e a percorrer os caminhos que levam a Ele? Gostaria de mencionar alguns caminhos, que derivam tanto da reflexão natural, como da própria força da fé. Gostaria de os resumir muito sinteticamente em três palavras: o mundo, o homem e a fé.

A primeira: o mundo. Santo Agostinho, que na sua vida procurou a Verdade por muito tempo e foi arrebatado pela Verdade, escreveu uma página lindíssima e célebre, na qual disse: «Perscruta a beleza da terra, do mar, do ar rarefeito e onde quer que se expanda; perscruta a beleza do céu... e todas as realidades. Todas te responderão: olha para nós e vê como somos bonitas. A sua beleza é como um hino de louvor. 

Ora, estas criaturas tão bonitas, mas também mutáveis, quem as fez se não aquele que é a beleza inalterável? (Sermo 241, 2: PL 38, 1134). Penso que devemos recuperar e fazer recuperar ao homem de hoje a capacidade de contemplar a criação, a sua beleza, a sua estrutura. O mundo não é um magma amorfo, mas quanto mais o conhecemos e descobrimos os seus mecanismos maravilhosos, tanto mais vemos um desígnio, vemos que existe uma inteligência criadora. Albert Einstein disse que nas leis da natureza «se revela uma razão tão superior que toda a racionalidade do pensamento e dos ordenamentos humanos em comparação é um reflexo absolutamente insignificante» (O Mundo como eu o vejo). Portanto, um primeiro caminho que leva à descoberta de Deus é a contemplação da criação com um olhar atento.

A segunda palavra: o homem. É sempre de santo Agostinho a frase célebre com a qual diz que Deus é mais íntimo de mim de quanto eu o seja de mim mesmo (cf. Confissões III, 6, 11). A partir disto ele formulou o convite: «Não saias de ti mesmo, entra em ti mesmo: a verdade habita no homem interior» (De vera religione, 39, 72). 

Este é outro aspecto que corremos o risco de perder no mundo ruidoso e dispersivo no qual vivemos: a capacidade de reflectir, de meditar em profundidade e de detectar aquela sede de infinito que trazemos no íntimo, que nos impele a ir além e nos remete para Alguém que a possa satisfazer. O Catecismo da Igreja Católica afirma: «Com a sua abertura à verdade e à beleza, com o seu sentido do bem moral, com a sua liberdade e a voz da sua consciência, com a sua ânsia de infinito e de felicidade, o homem interroga-se sobre a existência de Deus» (n. 33).

A terceira palavra: a fé. Sobretudo na realidade do nosso tempo, não devemos esquecer que um caminho que leva ao conhecimento e ao encontro com Deus é a vida da fé. Quem crê está unido a Deus, está aberto à sua graça e à força da caridade. Assim a sua existência torna-se testemunho não de si mesmo, mas do Ressuscitado, e a sua fé não teme mostrar-se na vida quotidiana, está aberta ao diálogo que expressa profunda amizade pelo caminho de cada homem, e sabe dar esperança a necessidade de resgate, de felicidade e de futuro. 

De fato, a fé é encontro com Deus que fala e age na história e que converte a nossa vida diária, transformando a nossa mentalidade, juízos de valor, escolhas e ações concretas. Não é ilusão, fuga da realidade, refúgio cômodo, sentimentalismo, mas é participação de toda a vida e é anúncio do Evangelho, Boa Nova capaz de libertar o homem todo. 

Um cristão e uma comunidade que sejam ativos e fiéis ao projeto de Deus que nos amou em primeiro lugar, constituem um caminho privilegiado para quantos vivem na indiferença e na dúvida acerca da sua existência e ação. Contudo, isto exige que o testemunho de fé de cada um se torne cada vez mais transparente, purificando a própria vida para que esteja em conformidade com Cristo. 

Hoje muitos têm uma concepção limitada da fé cristã porque a identificam com um mero sistema de crença e de valores e não com a verdade de um Deus que se revelou na história, desejoso de comunicar intimamente com o homem, numa relação de amor com ele. Na realidade, como fundamento de toda a doutrina e valor está o evento do encontro do homem com Deus em Jesus Cristo. O Cristianismo, antes de uma moral ou de uma ética, é o acontecimento do amor, é o acolhimento da pessoa de Jesus. Por isso o cristão e as comunidades cristãs antes de mais devem olhar e fazer olhar para Cristo, o verdadeiro Caminho que leva a Deus.

Papa Bento XVI

Desejar a Deus é um sentimento inscrito no coração do homem, porque o homem foi criado por Deus e para Deus.


desejo de Deus

Queridos irmãos e irmãs,

O caminho de reflexão que estamos a fazer juntos neste Ano da fé leva-nos hoje a meditar sobre um aspecto fascinante da experiência humana e cristã: o homem leva consigo um desejo misterioso de Deus. De uma forma significativa, o Catecismo da Igreja Católica inicia precisamente com a seguinte consideração: «Desejar a Deus é um sentimento inscrito no coração do homem, porque o homem foi criado por Deus e para Deus. Deus não cessa de atrair o homem a Si e só em Deus é que o homem encontra a verdade e a felicidade que não se cansa de procurar» (n. 27).

Esta afirmação, que também hoje em muitos contextos culturais parece ser totalmente partilhável, quase óbvia, poderia ao contrário parecer uma provocação no âmbito da cultura ocidental secularizada. Com efeito, muitos nossos contemporâneos poderiam objetar que não sentem minimamente tal desejo de Deus. Em amplos sectores da sociedade Ele já não é o esperado, o desejado, mas sim uma realidade que deixa indiferentes, face à qual nem sequer se deve fazer o esforço de se pronunciar. 

Na realidade, aquele que definimos «desejo de Deus» não desapareceu totalmente e apresenta-se ainda hoje, de muitas formas, ao coração do homem. O desejo humano tende sempre para determinados bens concretos, muitas vezes tudo menos que bens espirituais, e todavia encontra-se face à pergunta acerca do que é deveras «o» bem, e por conseguinte confronta-se com algo que é outra coisa e não é o eu, que o homem não pode construir, mas está chamado a reconhecer. O que pode deveras saciar o desejo do homem?

Na minha primeira encíclica, Deus caritas est, procurei analisar como este dinamismo se realiza na experiência do amor humano, experiência que na nossa época é mais facilmente sentida como momento de êxtase, de sair de si, como lugar no qual o homem sente que é atravessado por um desejo que o supera. Através do amor, o homem e a mulher experimentam de maneira nova, um graças ao outro, a grandeza e a beleza da vida e do real. Se o que experimento não é uma simples ilusão, se deveras quero o bem do outro como caminho também para o meu bem, então devo estar disposto a descentralizar-me, a pôr-me ao seu serviço, até à renúncia de mim mesmo. Por conseguinte, a resposta à questão acerca do sentido da experiência do amor passa através da purificação e da cura do querer, exigida pelo próprio bem que se quer ao outro. Devemos exercitar-nos, treinar-nos, até corrigir-nos, para que aquele bem possa deveras ser querido.

O êxtase inicial traduz-se assim em peregrinação, «êxodo permanente do eu fechado em si mesmo para a sua libertação no dom de si e, precisamente dessa forma, para o reencontro de si mesmo, mais ainda para a descoberta de Deus» (Enc. Deus caritas est, 6). Através deste caminho poderá progressivamente aprofundar-se para o homem o conhecimento daquele amor que inicialmente tinha experimentado. E assim vai-se delineando cada vez mais o mistério que ele representa: de facto, nem sequer a pessoa amada é capaz de saciar o desejo que se aninha no coração humano, aliás, quanto mais autêntico é o amor para o outro, tanto mais ele deixa abrir a interrogação acerca da sua origem e do seu destino, acerca da possibilidade que ele tem de durar para sempre. Por conseguinte, a experiência humana do amor tem em si um dinamismo que remete para além de si mesmo, é experiência de um bem que leva a sair de si e a encontrar-se diante do mistério que envolve toda a existência.

Poder-se-iam fazer também considerações análogas em relação a outras experiências humanas, tais como a amizade, a experiência do que é belo, o amor pelo conhecimento: cada bem experimentado pelo homem tende para o mistério que envolve o próprio homem; cada desejo que se apresenta ao coração humano faz-se eco de um desejo fundamental que nunca é plenamente saciado. Sem dúvida, deste desejo profundo, que esconde também algo de enigmático, não se pode chegar diretamente à fé. 

O homem, em síntese, conhece bem o que não o sacia, mas não pode imaginar ou definir o que lhe faria experimentar aquela felicidade da qual leva no coração as saudades. Não se pode conhecer Deus só a partir do desejo do homem. Sob este ponto de vista permanece o mistério: o homem é indagador do Absoluto, um indagador que dá passos pequenos e incertos. E contudo, já a experiência do desejo, do «coração inquieto» como lhe chamava santo Agostinho, é bastante significativa. Ela confirma-nos que o homem é, no profundo, um ser religioso (cf. Catecismo da Igreja Católica, 28), um «mendigo de Deus». Podemos dizer com as palavras de Pascal: «O homem supera infinitamente o homem» (Pensamentos, ed. Chevalier 438; ed. Brunschvicg 434). Os olhos reconhecem os objetos quando eles estão iluminados pela luz. Eis por que o desejo de conhecer a própria luz, que faz brilhar as coisas do mundo e com elas acende o sentido da beleza.

Por conseguinte devemos considerar que seja possível também na nossa época, aparentemente tão insensível à dimensão transcendente, abrir um caminho rumo ao autêntico sentido religioso da vida, que mostra como o dom da fé não é absurdo, não é irracional. Seria de grande utilidade, para este fim, promover uma espécie de pedagogia do desejo, quer para o caminho de quem ainda não crê, quer para quem já recebeu o dom da fé. Uma pedagogia que inclui pelo menos dois aspectos. Em primeiro lugar, aprender ou voltar a aprender o gosto pelas alegrias autênticas da vida. 

Nem todas as satisfações produzem em nós o mesmo efeito: algumas deixam uma marca positiva, são capazes de pacificar o ânimo, tornam-nos mais ativos e generosos. Outras, ao contrário, depois da luz inicial, parecem desiludir as expectativas que tinham suscitado e por vezes deixam atrás de si amargura, insatisfação ou um sentido de vazio. Educar desde a tenra idade para saborear as alegrias verdadeiras, em todos os âmbitos da existência — a família, a amizade, a solidariedade com quem sofre, a renúncia ao próprio eu para servir o próximo, o amor ao conhecimento, à arte, às belezas da natureza — tudo isto significa exercer o gosto interior e produzir anticorpos eficazes contra a banalização e o nivelamento hoje difundidos. 

Também os adultos precisam de redescobrir estas alegrias, de desejar realidades autênticas, purificando-se da mediocridade na qual podem encontrar-se envolvidos. Tornar-se-á então mais fácil deixar cair ou rejeitar tudo o que, mesmo se é aparentemente atraente, ao contrário se revela insípido, fonte de enebriamento e não de liberdade. E isto fará sobressair aquele desejo de Deus do qual estamos a falar.

Um segundo aspecto, que caminha a par com o precedente, é nunca se contentar com aquilo que se alcançou. Precisamente as alegrias mais verdadeiras são capazes de libertar em nós aquela inquietação sadia que leva a ser mais exigentes — querer um bem maior, mais profundo — e ao mesmo tempo sentir com clareza cada vez maior que nada de finito pode colmar o nosso coração. Assim aprenderemos a tender, desarmados, para aquele bem que não podemos construir ou obter com as nossas forças; a não nos deixarmos desencorajar pela fadiga ou pelos obstáculos que provêm do nosso pecado.

A este propósito não devemos esquecer contudo que o dinamismo do desejo está sempre aberto à redenção. Também quando ele se adentra por caminhos desviados, quando persegue paraísos artificiais e parece perder a capacidade de ansiar pelo bem verdadeiro. Também no abismo do pecado não se apaga no homem aquela centelha que lhe permite reconhecer o verdadeiro bem, saboreá-lo, e assim iniciar um percurso de subida, no qual Deus, com o dom da sua graça, nunca deixa faltar a sua ajuda. 

De resto, todos temos necessidade de percorrer um caminho de purificação e de cura do desejo. Somos peregrinos rumo à pátria celeste, rumo àquele bem pleno, eterno, que nada jamais nos poderá extirpar. Por conseguinte, não se trata de sufocar o desejo que se encontra no coração do homem, mas de o libertar, para que possa alcançar a sua verdadeira altura. Quando no desejo se abre a janela em direção a Deus, isto já é sinal da presença da fé no ânimo, fé que é uma graça de Deus. Sempre santo Agostinho afirmava: «Com a expectativa, Deus alarga o nosso desejo, com o desejo alarga o ânimo e dilatando-o torna-o mais capaz» (Comentário à Primeira carta de João, 4, 6; pl 35, 2009).

Nesta peregrinação, sintamo-nos irmãos de todos os homens, companheiros de viagem também de quantos não crêem, de quem está à procura, de quem se deixa interrogar com sinceridade pelo dinamismo do próprio desejo de verdade e de bem. Rezemos, neste Ano da fé, para que Deus mostre o seu rosto a quantos o procuram com coração sincero. Obrigado.

Papa Bento XVI